terça-feira, 1 de novembro de 2011

A paz






Nos últimos dias do século 19, um grande jornal de Nova York mandou um de seus repórteres entrevistar o chefe do departamento de patentes dos Estados Unidos. Imagino que fosse para engordar a edição de domingo. A missão do repórter era saber o que pensava aquele homem sobre novos inventos que surgiriam no século que começaria já que, o que findava fora pródigo em toda espécie de inovações. Mas o homem das patentes se mostrou cético. Para ele o século 20 seria muito sem graça naquele sentido, pois tudo que era importante já havia sido inventado.
Já bastante entrados no século 21, continuamos com o mesmo pensamento do homem das patentes. Sempre achamos que a humanidade está no auge de sua capacidade tecnológica, no ápice de sua cultura e que, por acaso, isso se deu durante nossa curta existência como seres humanos.
Outro dia um professor de Harvard lançou um livro no qual afirma que a humanidade nunca fora tão pacífica. Que os atos de terrorismo e guerras localizadas são apenas focos de violência que logo serão debelados e que caminhamos para a paz global. Não li o livro, devo confessar, e não pretendo lê-lo. Me fio nas informações divulgadas pelos telejornais. Não ria, o assunto é sério. Aliás, o que mais me deixou perplexo não foram as afirmações que os telejornais dizem conter no livro, mas a posição passiva dos mesmos. Nenhum debate, nenhuma voz interrogante partiu dos meios para, ao menos, jogar uma dúvida em quem ouviu a notícia.
Não tenho idéia dos argumentos usados pelo mestre de Harvard para justificar suas afirmações, mas para dizer o contrário eu tenho os meus. E afirmo que nunca a África foi tão violenta, que nunca o Oriente Médio foi tão violento. E que os povos continuam a ser tão oprimidos quanto sempre foram. E me refiro apenas a violência armada e não a que dela deriva.
Chechenos, que já foram perseguidos pelos czares, continuam a sê-lo por Medvedev. Os curdos são vítimas dos iraquianos e turcos que por sua vez já foram dominados e dominadores respectivamente. Os judeus, perseguidos e trucidados na Europa, perseguem e trucidam na Palestina ocupada. .Curdos, bascos, chechenos, palestinos, irlandeses e outros povos continuam sem pátria. Aos atos rebeldes desses povos, da-se o nome de terrorismo.
As potências ocidentais continuam com a mesma arrogância de sempre e se alguma voz discorda, um reizinho brada:_ Por que no te callas? Tudo se passa sob o olhar cúmplice da grande imprensa mundial concentrada nas mãos de poucos. Cada vez menos. Murdoch, depois do escândalo que abalou a credibilidade (?) da imprensa inglesa, pôs seus tablóides á serviço do governo daquele país para ajudar a identificar os revoltosos que sacudiram a Inglaterra com o som e as chamas de sua ira.
Cabe mesmo imaginar que o autor desconhece a ação intimidatória que os países da Europa ocidental estão perpetrando contra a Rússia com seu escudo anti-mísseis. Ou então ele acredita que quem quer a paz prepara a guerra.
No norte da África a “primavera árabe” põe uma interrogante quanto às ligações do Egito com Israel, antes estáveis e até cordiais. A Síria, “inimiga confiável” do estado judeu, também o será, tão logo caia o governo de Assad. E a Líbia pode se tornar um estado de muitos Kaddaf.
As relações entre os Estados Unidos e o Paquistão se deterioraram depois do assassinato de Bin Laden. Se por um lado os americanos não engoliram a estada do líder da Al Qaeda naquele país, dentro do Paquistão o anti-americanismo ganha força no seio do principal sustentáculo do governo, o exército.Como sabemos os norte americanos não são de discutir a relação, vão logo pra porrada.  Estas informações eu não as colho de fonte secreta e sim dos meios de comunicação mais comuns, confrontando opiniões e notícias às quais todos têm acesso. Mas parece que o professor de Harvard assiste outros canais. Faz lembrar os dias e semanas que se seguiram à queda do muro de Berlin quando a imprensa ocidental em uníssono  anunciou uma nova era de paz mundial e entendimento entre os povos. Naqueles dias eram travados dezenas de conflitos mundo a fora, mas nenhum que merecesse a atenção dos meios “ocidentais”.Logo após o episódio que começou a pôr fim ao império soviético tivemos, com o esfacelamento da Iuguslávia, um dos maiores genocídios da Europa. Enquanto na antiga União Soviética, as reivindicações de independência foram tratadas com os tanques à frente, situação que perdura na Chechênia.
Outro fato presente em todos os noticiários recentes é a perseguição praticada em todos os países da Europa e também nos Estados Unidos contra os muçulmanos. Estão acendendo o estopim, a explosão não tarda. A ascensão da direita ao poder nos diversos países em crise e o crescimento da extrema direita apenas agrega mais pólvora.
Se isto fora pouco, temos o azedume com que vêm se tratando os países europeus por motivo da crise. A Alemanha já não é bem quista. Países como Portugal e Espanha, antes tão europeístas nos noticiários de suas televisões, agora falam de si como “países periféricos”, “países do sul”. Outro dia assistindo a um programa da Deutch Welle falado em castelhano, pude constatar esse azedume quando o jornalista espanhol interpelava seu colega alemão.
Os augúrios de paz mundial, que a televisão diz conter na obra do professor, fazem lembrar o que diziam os belicistas de 1914. _ “Uma guerra para acabar com todas as guerras”. Depois da frase veio a história.




















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