Olhava para a televisão mas
pensava na morte da bezerra, estavam passando o Redação Sportv. De repente, na
tela surgem duas mulheres maravilhosas, passistas com suas sandálias de plataforma,
pernas longas, bundas exuberantes, cinturas de vespa e sorrisos de miss Brasil.
Entre elas, Vagner Love, o artilheiro do amor, dizia no pé. Creio que era a
apresentação do novo uniforme do Flamengo. Sim, era isso. Foram poucos minutos.
De volta ao estúdio, um dos convidados do programa foi quem primeiro falou:_ “Acho
isso ridículo”. Falou e sorriu ridiculamente. O apresentador e o outro
convidado, timidamente, muito timidamente disseram algo sobre o Flamengo ser
festeiro, que era assim mesmo. Diante da pouca ênfase o convidado repetiu:_”Acho
isso ridículo”.
Deixei de cogitar sobre o
falecimento do bovino e passei a seguir o programa. Fiquei sabendo que o
convidado se chamava Zezinho ou Huguinho ou Luizinho. Sei lá. Era um Inho
desses.
Cá entre nós, quando o sujeito já carrega cabelos
grisalhos e sua barriga o antecede que nem carro abre alas em desfile de escola
de samba, o diminutivo já não cabe. Exceção feita aos boleiros, o apelido
infantil deve restringir-se ao lar materno. Mas nosso Zezinho, ademais do
nomezinho tem um alto cargo:_É produtor do Fantástico. Mas mesmo sendo homem de
televisão, não sabe comportar-se diante das câmeras e fala com a mão fechada
diante da boca. Ri, antes de todos, das anedotas que conta. Olha o alem
enquanto filosofa sobre o programa que produz e encara os circundantes para
colher aprovações.
Sempre imaginei que para quem
comanda o tal programa apresentado por Zeca Camargo, a palavra “ridículo” fosse
um tabu. Pensava que só um cunhado mala, depois de tomar várias, teria a
desfaçatez de pronunciar o vocábulo diante do responsável pela revista
dominical. Não é assim. Huguinho usou-o duas vezes diante das câmaras e em
horário matinal.
Mas o que vira de ridículo o
produtorzinho do Fantástico? Mulheres gostosas? O artilheiro passista? Samba em
véspera de carnaval? Três pessoas negras como protagonistas? Acho que tudo
isso. Talvez , para Zezinho, a apresentação do novo uniforme do Flamengo
devesse ser feita ao som de um quarteto de cordas e com Gisele Bündchen
envergando o manto sagrado.
Luizinho, devido ao cargo de enorme relevância
cultural que ocupa na Rede Globo, deve ter um ótimo salário, faz parte das
castas superiores de nossa sociedade e como tal deve execrar qualquer coisa que
venha das camadas inferiores. Noblesse oblige e ele não está só. Júlio
Medaglia, Mônica Valdvogel, Luís Felipe Pondé, Rita Lee, Arnaldo Jabor, Renato
Maurício Prado, Marcelo Mirisola e outros, lhe fazem companhia. De todos já
escutei alguma vez, algo que os aproxima, que os irmana ao dono das noites de
domingo. Adriano na laje, é risível para Renato. Baile funk, ato criminal para
Mônica. Hip Hop faz Medaglia ter acesso de fúria. As rimas de Ferrés são
imbecis para Mirisola. Vagner Love sambando com as mulatas, ridículo.
Para Huguinho e os seus, nada é
mais ridículo que alguém ganhe mais dinheiro que eles e não siga os ditames que
sua classe tanto estima. Não falar inglês perfeitamente, por exemplo, é sinal
de inferioridade que merece o riso e a galhofa. Joel Santana não tinha seu
trabalho como técnico julgado pelos comentaristas e sim o seu inglês, que ele
ia aprendendo com o andar da carruagem, enquanto tentava colocar o fraco time
sul africano nos eixos. Papai Joel, que é malandro, hoje fatura num comercial
de tv graças ao deboche de que era vítima.
Joel e Love podem se dar ao luxo
de fazer pouco caso dos comentários da turma de Luizinho. Outra coisa ocorre
com os garis que foram ridicularizados por Boris Casoy ao desejarem feliz ano
novo “do alto de suas vassouras” como disse o ex-integrante do CCC. Ou os
freqüentadores da represa de Guarapiranga, os banhistas do piscinão de Ramos,
os camelôs, as domésticas, os favelados, suburbanos em geral. Na tela da
televisão ou nas redes sociais o achincalhe é a norma.
Pouco se pode fazer para
controlar a turma de Zezinho, eles são os formadores de opinião. Se o
comediante(?) compara jogador de futebol com macaco, é humor, quem se indigna,
censor. Vagner Love com mulatas é ridículo, Kaká com a bispa Sônia, exemplo.
Depois da declaração ridícula de
Luizinho no programa esportivo, ainda deu tempo de recolher mais uma amostra do
tratamento dispensado às pessoas que nasceram na classe errada com a cor
errada. Na última página do Diário Catarinense, que circulou poucos dias antes
do carnaval, via-se uma foto de uma mulher muito bonita e sensual vestindo
vermelho. Sobre a foto os dizeres:_”As rainhas e seus castelos” A frase fazia
referência às rainhas de bateria das escolas de samba de Floripa. A moça está
ao lado de uma parede velha, o reboco já caindo. Talvez sua casa. Duvido que
ela tenha sido alertada sobre o conteúdo da matéria e a grosseria do sarcasmo. Em
letras menores o autor da má intencionada piadinha continua:”Não importa de
onde elas venham...” Saiu a emenda pior que o soneto e as entrelinhas rugiam de
prazeroso preconceito.
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