quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

É fantástico







Olhava para a televisão mas pensava na morte da bezerra, estavam passando o Redação Sportv. De repente, na tela surgem duas mulheres maravilhosas, passistas com suas sandálias de plataforma, pernas longas, bundas exuberantes, cinturas de vespa e sorrisos de miss Brasil. Entre elas, Vagner Love, o artilheiro do amor, dizia no pé. Creio que era a apresentação do novo uniforme do Flamengo. Sim, era isso. Foram poucos minutos. De volta ao estúdio, um dos convidados do programa foi quem primeiro falou:_ “Acho isso ridículo”. Falou e sorriu ridiculamente. O apresentador e o outro convidado, timidamente, muito timidamente disseram algo sobre o Flamengo ser festeiro, que era assim mesmo. Diante da pouca ênfase o convidado repetiu:_”Acho isso ridículo”.
Deixei de cogitar sobre o falecimento do bovino e passei a seguir o programa. Fiquei sabendo que o convidado se chamava Zezinho ou Huguinho ou Luizinho. Sei lá. Era um Inho desses.
 Cá entre nós, quando o sujeito já carrega cabelos grisalhos e sua barriga o antecede que nem carro abre alas em desfile de escola de samba, o diminutivo já não cabe. Exceção feita aos boleiros, o apelido infantil deve restringir-se ao lar materno. Mas nosso Zezinho, ademais do nomezinho tem um alto cargo:_É produtor do Fantástico. Mas mesmo sendo homem de televisão, não sabe comportar-se diante das câmeras e fala com a mão fechada diante da boca. Ri, antes de todos, das anedotas que conta. Olha o alem enquanto filosofa sobre o programa que produz e encara os circundantes para colher aprovações.
Sempre imaginei que para quem comanda o tal programa apresentado por Zeca Camargo, a palavra “ridículo” fosse um tabu. Pensava que só um cunhado mala, depois de tomar várias, teria a desfaçatez de pronunciar o vocábulo diante do responsável pela revista dominical. Não é assim. Huguinho usou-o duas vezes diante das câmaras e em horário matinal.  
Mas o que vira de ridículo o produtorzinho do Fantástico? Mulheres gostosas? O artilheiro passista? Samba em véspera de carnaval? Três pessoas negras como protagonistas? Acho que tudo isso. Talvez , para Zezinho, a apresentação do novo uniforme do Flamengo devesse ser feita ao som de um quarteto de cordas e com Gisele Bündchen envergando o manto sagrado.
 Luizinho, devido ao cargo de enorme relevância cultural que ocupa na Rede Globo, deve ter um ótimo salário, faz parte das castas superiores de nossa sociedade e como tal deve execrar qualquer coisa que venha das camadas inferiores. Noblesse oblige e ele não está só. Júlio Medaglia, Mônica Valdvogel, Luís Felipe Pondé, Rita Lee, Arnaldo Jabor, Renato Maurício Prado, Marcelo Mirisola e outros, lhe fazem companhia. De todos já escutei alguma vez, algo que os aproxima, que os irmana ao dono das noites de domingo. Adriano na laje, é risível para Renato. Baile funk, ato criminal para Mônica. Hip Hop faz Medaglia ter acesso de fúria. As rimas de Ferrés são imbecis para Mirisola. Vagner Love sambando com as mulatas, ridículo.
Para Huguinho e os seus, nada é mais ridículo que alguém ganhe mais dinheiro que eles e não siga os ditames que sua classe tanto estima. Não falar inglês perfeitamente, por exemplo, é sinal de inferioridade que merece o riso e a galhofa. Joel Santana não tinha seu trabalho como técnico julgado pelos comentaristas e sim o seu inglês, que ele ia aprendendo com o andar da carruagem, enquanto tentava colocar o fraco time sul africano nos eixos. Papai Joel, que é malandro, hoje fatura num comercial de tv graças ao deboche de que era vítima.
Joel e Love podem se dar ao luxo de fazer pouco caso dos comentários da turma de Luizinho. Outra coisa ocorre com os garis que foram ridicularizados por Boris Casoy ao desejarem feliz ano novo “do alto de suas vassouras” como disse o ex-integrante do CCC. Ou os freqüentadores da represa de Guarapiranga, os banhistas do piscinão de Ramos, os camelôs, as domésticas, os favelados, suburbanos em geral. Na tela da televisão ou nas redes sociais o achincalhe é a norma.
Pouco se pode fazer para controlar a turma de Zezinho, eles são os formadores de opinião. Se o comediante(?) compara jogador de futebol com macaco, é humor, quem se indigna, censor. Vagner Love com mulatas é ridículo, Kaká com a bispa Sônia, exemplo.
Depois da declaração ridícula de Luizinho no programa esportivo, ainda deu tempo de recolher mais uma amostra do tratamento dispensado às pessoas que nasceram na classe errada com a cor errada. Na última página do Diário Catarinense, que circulou poucos dias antes do carnaval, via-se uma foto de uma mulher muito bonita e sensual vestindo vermelho. Sobre a foto os dizeres:_”As rainhas e seus castelos” A frase fazia referência às rainhas de bateria das escolas de samba de Floripa. A moça está ao lado de uma parede velha, o reboco já caindo. Talvez sua casa. Duvido que ela tenha sido alertada sobre o conteúdo da matéria e a grosseria do sarcasmo. Em letras menores o autor da má intencionada piadinha continua:”Não importa de onde elas venham...” Saiu a emenda pior que o soneto e as entrelinhas rugiam de prazeroso preconceito.














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