Terminou o julgamento do juiz
espanhol Baltasar Garzón. Por unanimidade a corte suprema de seu país o
condenou a 11 anos de inabilitação. Garzón já não é mais juiz. Sua condenação
se deu por crime de prevaricação. O magistrado autorizara grampos nas conversas
telefônicas entre réus do caso Gürtel e seus advogados. Violara um preceito
fundamental da justiça.
Mas como um experiente e
competente magistrado faz algo tão disparatado?
Mesmo tendo o oceano Atlântico
entre mim, o meritíssimo juiz e as altas cortes do reino de Espanha, me arrisco
a cogitar que Garzón vira fortes indícios da participação dos advogados em algo
ilícito. Que a prática advocatícia destes, carecia de ética ou que estavam
diretamente involucrados no rumoroso caso de corrupção. Infelizmente a imprensa
espanhola não faz tais cogitações e exulta com a condenação de Garzón.
Ainda que cause perplexidade que
o primeiro condenado no caso Gürtel seja o juiz instrutor, os defensores da
decisão do supremo tribunal espanhol, dizem que foi melhor assim, pois se o
processo redundasse na condenação de algum dos imputados, cujas conversas com
advogados, foram grampeadas, estes poderiam pedir a anulação de todo o processo
por vício de origem na instrução.. No programa “Los desayunos de TVE” exibido
hoje (sexta, 10) apenas um dos três jornalistas que compunham a mesa de debates
se posicionou contra a decisão que condenou Garzón. Em sua opinião, o recado estava dado:_ Na
Espanha há veredas que não devem ser transitadas pelos que investigam. No mesmo
programa, minutos depois, a porta-voz do poder judiciário espanhol, trajando um
vestido cor de jerimum com bolinhas brancas, foi enfática ao afirmar que
“España esta a cabeza de Europa em justicia
garantista”. Há controvérsias.
Garzón era uma espécie de herói nacional em
seu país e ficou internacionalmente conhecido por mandar prender o ex-ditador
chileno Augusto Pinochet quando este se encontrava em território espanhol. Seus concidadãos viam-no como um repartidor
de justiça que ensinava, a povos menos esclarecidos, as regras do bom direito.
Espanha cumpria seu papel civilizador frente às ex-colônias.
Talvez motivado pelo sucesso de
sua intervenção no caso do açougueiro sul americano, e em ordem invertida do
que deveriam ser suas prioridades de magistrado espanhol, Garzón começou a
investigar os crimes do franquismo e creio que aí está o principal motivo de
sua condenação no outro caso que investigava.
Como já disse, milhares de quilômetros sobre o
mar tenebroso me separam da pátria de Cervantes, mas penso que o franquismo
ainda fratura mais a sociedade espanhola que o atual bi-partidarismo de fato.
Garzón reabriu feridas que uns queriam ver esquecidas e outros sequer admitem
que hajam existido. Quem nasceu no ano da morte do caudilho, hoje tem filhos e
o revisionismo histórico entrou na moda nos anos 90. O juiz trafegou na
contramão
Tanto é assim que Garzón também
é réu no caso dos crimes franquistas e como deixou de ser juiz, não tem mais
direito a foro privilegiado e poderá ser julgado em tribunal comum. Esta decisão depende do arbítrio da corte
suprema que poderia avocar a si o direito de julgá-lo.
Julgamentos como esse, desnudam
uma sociedade e seu sistema de valores. Os grampos nas comunicações telefônicas
entre réus e advogados que determinaram o afastamento do juiz e sua
inabilitação, estão previstos e legalizados na Espanha quando se trata de
terrorismo. Mas se não houve julgamento ou se o caso se encontra em sede
recursal, como saber que de terrorismo se trata? Basta a acusação genérica de
terrorismo para que, naquele país, se solape a mais importante das garantias
jurídicas, a presunção de inocência.
A Garzón, resta recorrer à Corte
Constitucional mas esta não tem poder para modificar o veredicto podendo apenas
exigir novo julgamento. Caberia ainda uma apelação às cortes internacionais. O
advogado do juiz promete combate.
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