segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

Pra quem?







Outro dia, trocando os canais da televisão em busca de um futebolzim, parei uns minutos na TV Câmara. Estavam passando uma audiência pública ou algo do gênero. Falava um senhor e no pé da tela estava escrito seu nome e qualificação. Era economista e professor universitário da matéria. Tratava da questão dos créditos. Comparava o crédito imobiliário com o crédito concedido para compra de bens duráveis. Dizia que quando alguém compra uma geladeira e não pode paga-la, esse crédito está perdido, pois uma geladeira que foi comprada por R$1.000, depois de usada, não valeria mais que R$ 150.
Estava na cara que o economista nunca comprara uma geladeira usada. Mas inventou um número mágico e com ele defendia sua tese. Algo bastante comum entre os economistas. Deixei pra lá e continuei procurando alguém que chutasse uma bola.
Mas a geladeira de R$150, me fez lembrar que estou sem máquina de lavar já faz muito tempo e preciso comprar uma usada. Não vou achar por menos de R$400, e bem velhinha. As duas que tive foram compradas usadas e paguei mais que isso na última. Talvez no brechó do economista...
E é aí que está o problema; o economista não tem um brechó. Ele e seus pares vivem ocupados resolvendo nossas vidas. Planos e medidas econômicas lhes tomam todo o tempo.Uns executam, outros criticam. Uns dizem que não devo fazer crédito para comprar a lavadora, outros vão falar que eu acho uma usada por R$150. Entonces dame dos, diria minha mulher.
Assim como o economista que não quer que eu compre a máquina de lavar, não manja nada de aparelhos usados, também os que cuidam dos empregos jamais procuraram um. Ou você imagina o Eduardo Matarazzo Suplicy ou o Jorginho Bornhausen deixando o currículo em alguma empresa? Já ouviu alguém comentar que encontrou o secretário de transportes no ramal de Deodoro? Ou que o ministro da saúde operou a vesícula no S.U.S da Penha?  Não. Quem cuida de nossas vidas não tem nem idéia de como vivemos.
Só tem um serviço público que é utilizado por nossos dirigentes políticos e nossas elites. É a universidade pública e gratuita.
Este feudo que a burguesia gentilmente divide com a classe média do país, está agora ameaçado pela política de cotas. Vozes indignadas com tal afronta se levantam e falam de racismo, de privilégios. O jornalista Japiassu comentou o quão difícil é ser branco no Brasil nos dias de hoje. O professor Magnoli sequer admite que existam negros. Outros falaram que os alunos cotistas saídos da escola pública não conseguiriam acompanhar o ritmo dos cursos universitários. Quando os primeiros números relativos aos cotistas saíram, caiu por terra essa argumentação.
Nenhum dos dados me surpreendeu. Já os esperava. A média de aprovação de cotistas e não cotistas é a mesma. A freqüência às aulas entre os cotistas é maior assim como é muito menor o abandono do curso. Claro, os alunos cotistas não têm a segunda opção na empresa do papai. Tampouco abandonam o curso para fazer uma viagem à Índia em busca de auto conhecimento. As moças do curso de pedagogia ou psicologia pretendem ser pedagogas ou psicólogas. Não estão se adornando de conhecimento e diploma enquanto esperam um marido bem sucedido.  
Se a política de cotas põe um mínimo de justiça em nosso sistema de ensino, não toca em outra aberração que é a gratuidade para quem nem de longe precisa dela. No último vestibular da Fuvest, o maior do país, 68% dos inscritos vinham da escola particular. Entre os aprovados este número cresce muito. Não fossem as cotas e teríamos algo próximo aos 100% devido ao sucateamento da escola pública.
O governo federal, através de sua instruída burocracia, criou o Pró-Uni para financiar os estudos de quem não passou pelo funil de nossas universidades públicas. A seleção desses agraciados passa pelo Enem, que não deixa de ser um vestibular, um concurso para o qual estão melhor preparados os alunos vindos da escola particular. Não sei que peso tem na escolha, os dados sócio-econômicos dos que se inscrevem para obter o financiamento. Mas os que conseguem a dádiva federal, ao final do curso terão que pagar seus estudos, podendo fazê-lo, prestando serviço nas escolas públicas, graça suprema
Quanto àqueles que concluem seus estudos acadêmicos gratuitamente, nas universidades públicas, nada devem, embora sua formação seja mais custosa para a sociedade. Se fosse menos dispendiosa não faria sentido o financiamento federal para os ingressados em universidades particulares.
Dados do último vestibular da Fuvest, apontam que as famílias de 15% dos aprovados, possuem 3 ou mais carros. Mas isso significaria pouco caso os seus filhos tivessem alguma obrigação para com a sociedade depois de graduados. Isso não se dá. Diploma nas mãos, podem partir para o mercado, mesmo que este seja fora do país. Países como a Alemanha já concluíram que é mais barato e prático suprir o déficit de profissionais especializados com mão de obra oriunda dos países em desenvolvimento. A evasão de talentos não é coisa dos dias de hoje. Apenas se agravou.
O tema da gratuidade nas universidades públicas é tabu. Nossos representantes no congresso pertencem, em sua grande maioria, às classes mais abastadas e usufruíram do “direito” de freqüentar o ensino superior sem pagar nada por isso. Querem o mesmo para seus filhos e os de sua classe. Mesmos nos partidos comprometidos com as causas populares, só se toca no assunto quando o ensino gratuito, de uma maneira geral, está em discussão. Esses partidos não querem mexer com os universitários, que mesmo sendo filhos das “boas famílias”, formam base importante da esquerda mais conseqüente.
Não se trata aqui de defender a privatização do ensino superior, pelo contrário. O que se deve questionar, na minha humilíssima opinião, é:_Universidade pública e gratuita para quem? A reposta me parece óbvia. Universidade pública e gratuita para quem sai da escola pública e gratuita.










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