Conheci o Joel no botequim que
ambos freqüentávamos em Copacabana, no final dos anos 70 ou princípios dos 80.
Era um cara baixinho e magro, de uma robustez nordestina, sertaneja. Alagoano,
era um típico malandro carioca. Malandro no melhor e mais carioca dos sentidos.
Sabia levar a vida. Batalhava sempre e muito. Foi ajudante de pedreiro,
apontador de obra, camelô, bicheiro, o diabo.
Fumava um, que comprava sempre
na Cidade de Deus. A de Deus, como ele chamava. Também gostava de uma birita e
nos tempos duros dividíamos os venenos que o João, sócio do botequim, arranjava pra
gente. Esse veneno consistia numa mistura de muitas bebidas pouco pedidas:
creme de ovos, vinho de catuaba, bíter, um vermute de marca suspeita e pra completar o copo
grande, cachaça barata. Dava pra ficar doidão sem dar prejuízo ao nosso amigo
do botequim. No fim do expediente, ajudávamos a lavar a casa e ainda comíamos
os bifes de fígado e pedaços de galinha cozida que a clientela havia
desprezado. Foi o melhor dos tempos, era o pior dos tempos, como disse o
escritor inglês.
Sua época de prosperidade foi
quando vendia plaquê na Av. Copacabana. Como não tinha conta em banco quem guardava
seus ganhos era o João. O bar era seu banco. Depois veio um tempo escuro. Joel
continuava indo ao bar. Eu também. Nunca o vi reclamar da vida nem pôr a culpa
de suas desditas em
outro. Levava tudo muito filosoficamente.
Joel falava o idioma do povo, e nele era mestre. Sua narrativa malandreada do mito bíblico de Sansão e Dalila, foi uma das coisas mais saborosas que já escutei.
Nossos papos, naquelas noites de botequim, não eram sobre a vida de um ou de outro, eram sobre a vida. Joel não tinha nenhuma afetação nem pose de malandro. O cara não se dizia, era.
Nossos papos, naquelas noites de botequim, não eram sobre a vida de um ou de outro, eram sobre a vida. Joel não tinha nenhuma afetação nem pose de malandro. O cara não se dizia, era.
Jamais me falou de família, só
de momentos bons da infância em
Alagoas. Era um cara só. Pelo menos no Rio não contava com
ninguém.
Tínhamos uma amizade de
botequim, respeitosa e discreta. Nunca soube nada de sua vida amorosa e só
conheci um endereço seu quando ele me apresentou a uma amiga com quem tive um caso.
Ambos moravam no mesmo prédio no Bairro de Fátima. No meio dessa minha história
com essa mulher, houve algo envolvendo bagulho que sujou a barra dele junto a
alguém com quem dividia o apartamento ou algo assim. Não lembro bem.
Mesmo depois de já estar casado
e não freqüentar mais o botequim de Copacabana, eu sempre encontrava o Joel
pelas ruas do Rio. Escrevendo bicho. Quando nos víamos ele abria seu franco
sorriso e saudava: _Grande Mineiro. Púnhamos os assuntos em dia e zombávamos da
vida. A última vez que o vi foi em 92.
Em plena era Collor, eu tinha minha banca de
camelô próxima ao metrô da Glória. Eu chegava cedo para ver se vendia algo pra
alguém indo pro trabalho e aí ficava até o sol se pôr. Na maioria dos dias eu
só arrumava pro pão com mortadela e um limão pra limonada. Foram tempos duros.
Um dia vi passar o Joel e o
chamei. Tivemos um de nossos papos, falamos daqueles dias bicudos e ele me
contou que estava correndo atrás. Havia perdido o emprego numa banca de bicho
pois com a queda do movimento o gerente do ponto resolveu despedir um dos
escreventes. Joel se prontificou a deixar o trabalho pois o outro cara que escrevia tinha
família e precisava mais do salário. Velho malandro maneiro.
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Grandes "Js". Joel, Joao, Jorge...
ResponderExcluirObrigado por mais esta entrega, Aurelio querido y extrañado.