terça-feira, 10 de julho de 2012

A novela







Faz mais de dez anos que não assisto TV aberta comercial, ou melhor, assisto o futebol e algum pedaço de noticiário. Mas os humorísticos, programas de entrevistas e novelas, nunca mais vi.
Outro dia, escutei na GloboNews um cara falando da novela que estreara, não sei quem era o cara mas devia ser diretor ou coisa assim. Falou tantas maravilhas do folhetim que eu fiquei curioso. Curioso e bobo, você dirá, afinal, se o cara trabalha na novela, queria que ele dissesse o que?
Li que Gilberto Gil está assistindo o folhetim, creio que mencionou isso no seu depoimento para o Museu da Imagem e do Som. Jabor escreveu que não perde um capítulo. Eu tinha de ver.
Esperei a oportunidade e tentei assistir um capítulo. Bem, quando sintonizei a emissora dos Marinho, o capítulo já estava pela metade, ainda assim foi tempo suficiente para ver que de ineditismos não havia nada. Vi uma moça (a mocinha) lendo umas cartas que lhe haviam escondido tempos atrás e agora chegavam às suas mãos. Lia e chorava. Toda mocinha chora durantes os 168 capítulos iniciais de qualquer novela. Soube também que há uma vingança na trama (em qual não há?) e que o mocinho está de casamento marcado com outra. Oh! E, é claro, tem uma vilã má pra dedéu que durante o decorrer da novela tende a crescer em vilania, promete o autor nas redes sociais.
O rapaz que faz o papel do mocinho é uma dessas pessoas desinibidas que pensa que não ter acanhamento diante das câmeras, faz do exibido um ator. Sua falta de expressividade exige que o diálogo seja explicativo ou não saberíamos o que se passa com ele. Ou talvez, como seu personagem é um jogador de futebol, ele tenha se inspirado no Riquelme, “o homem da máscara de nada”.
Na cena seguinte a mocinha está chegando na casa do mocinho que tem casamento marcado com outra e tão logo ele abre a porta, se lhe atira em cima aos chupões. Não o abraça, o cavalga com as pernas entrelaçadas em torno de seus quadris. Se as tramas das novelas são pouco realistas, o mesmo não se pode dizer dos chupões, estes são hiper-realistas. 9 da noite é a hora do orgasmo, o momento ponto G da Globo.
A cena era tórrida demais para se assistir ao lado do neto de seis anos. Mudei de canal.
Dias depois, li uma entrevista com o autor da novela na revista Veja. Ele falava do sucesso e o creditava à ambientação da trama: o subúrbio carioca em vez da zona sul. Falou dos novos tempos e dos novos ricos, que ele chama de pobres ricos. E falou do subúrbio que ele conheceu quando criança com sua mãe antropóloga. Pareceu-me muito engraçado o fato de um carioca conhecer o subúrbio antropologicamente. Acrescentou que seu subúrbio novelesco é feito de referências literárias.De Lima Barreto e Nelson Rodrigues até Vitor Hugo e Dostoievski.
Para o autor, suburbano tem de falar errado. Segundo ele, se seus personagens falassem um português castiço soaria falso. Mas onde se fala português castiço? Em Ipanema?. Na Rede Globo? Esqueceu-se o Sr. Carneiro, que Lima Barreto era suburbano. Fernanda Montenegro também. Sérgio Cabral, pai, idem. Mas, dizia, sempre que um personagem dessa origem fala mal, alguém corrige. Ainda assim, salientou, tem havido reclamações e ele ia começar a maneirar no linguajar dos incultos. Certamente para não ferir a sensibilidade dos telespectadores das classes altas que falam português castiço e que, ainda segundo ele, também simpatizam com a novela que trata de periféricos.
Seguramente o autor vai reivindicar seu papel na história da tele-dramaturgia por ter dado papel protagonista aos suburbanos.
No começo dos anos 70, a novela “Bandeira 2”, escrita por Dias Gomes, era totalmente ambientada no subúrbio e seus personagens centrais eram os bicheiros Tucão e Jovelino Sabonete. Este último tinha esse apelido por lavar sempre as mãos, pois era traumatizado por ter passado a infância em um lixão. Havia uma taxista, vivida por Marília Pêra, e também um jogador de futebol. Em “O cafona”, outra produção do gênero, o protagonista era um suburbano que enriquecera com seus “Supermercados Ataíde”. O personagem vivido por Francisco Cuoco, bebia a lavanda da mesa como entrada e usava ternos bizarros. E olha que para se vestir bizarramente nos anos 70 o cara tinha de caprichar. Tanto nas produções dos anos 70 como na de agora, o morador do subúrbio é retratado de maneira estereotipada e folclórica.
Ou seja, pelo pouco que vi, não há nada de novo na grande novidade.


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