Uma noite, há alguns anos atrás, eu estava fazendo o que
mais gosto: estava num bar tomando
cerveja. Enquanto via as modas, escutava uns fiapos de conversas que vinham das
mesas próximas. Falava-se da internet que engatinhava no Brasil.
Um computador e, mais ainda, o acesso à rede, eram coisas
muito distantes de meu bolso e de minhas cogitações. Mesmo assim fiquei
assuntando e ainda guardo a impressão que me deixou aquela conversa; as pessoas
pareciam enfeitiçadas pela nova tecnologia. Mais que enfeitiçadas, estavam
cultivando um fetiche. A coisa já deveria ter passado, mas não. A cada dia há
uma novidade no mundo digital e o fetiche continua.
Há pouco mais de dois anos, quando vários países árabes
foram sacudidos por revoltas e protestos, os meios de comunicação ocidentais,
no afã de catalogar os episódios, primeiro lhes deu um nome: primavera árabe. Depois afirmaram que todo o movimento teve como
eixo principal as redes sociais. Era como se as revoltas e revoluções só se
tornaram possíveis graças às redes sociais. Os fatores objetivos e subjetivos
que levaram aquelas pessoas às ruas arriscando
a própria vida, não contavam. Era tudo por obra e graça das redes sociais.
Tal afirmação demonstra o total desconhecimento que se tem
da realidade vivida por aqueles povos, no ocidente. Os jornalistas enviados às
pressas para cobrir tais eventos, depois de umas conversas com seus colegas
locais que falam inglês e os bajulam, tiram as mais esdrúxulas conclusões dos
fatos e tentam nos vender algo que pensam que estamos aptos a entender. Daí o
mito das redes sociais nas revoltas árabes.
Quando esteve no Brasil, uma militante que participou da
revolta no Egito, se mostrou indignada com essa abordagem reducionista da
imprensa ocidental sobre os acontecimentos em seu país.
A história está repleta de revoltas espontâneas que sacudiram
e mudaram sociedades sem contar com mais nada que não fosse a necessidade de
mudanças e a vontade do povo de fazê-las. Antes de existirem as tais redes,
antes mesmo de haver jornais.
Para o efeito de mobilização das massas, as redes sociais
têm menos potencial que uma rádio pirata ou um panfleto pregado no poste. Sua abrangência mundial pouco importa
nos acontecimentos locais. Ninguém vai sair do Brasil ou do Nepal para se
revoltar no Egito.