sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Evoé, Momo



                Até alguns anos atrás, a rede de TV aberta CNT transmitia o desfile das escolas de samba do grupo de acesso do Rio. As imagens geradas, não eram lá grande coisa, faltavam recursos técnicos à emissora. Mas pelo menos a narração do desfile não era feita por narradores paulistas de futebol convertidos em autoridades do samba.
                Foi numa dessas transmissões da CNT que assisti a um dos desfiles mais emocionantes de que tenho lembrança. 
                A escola era a Unidos do Jacarezinho, promovida no ano anterior.  Escola pobre, muito pobre, creio que nesse mesmo ano voltou ao grupo 3. Mas o desfile foi encantador. Só se via gente da comunidade. Moradores anônimos do morro que dá nome à agremiação. Todos os componentes cantavam o samba de enredo, com vontade, com paixão. A escola sambava.
                Lembro, mais que nada, de uma mulher, uma passista. Uma dessas pessoas que a dureza da vida, as privações e injustiças, tornam velha aos 40 anos. Essa mulher não jogava beijinhos para a câmara, não marchava coberta de plumas, não era destaque nem rainha de bateria. Essa mulher cantava e sambava, se divertia com sua arte, toda entregue ao ritmo, ao batuque. Era lindo de ver. Nela estava a essência do samba, da escola, do povo, do carnaval.
               Creio que o contrato da CNT com a Liga independente das Escolas de Samba, terminou, assim como o sinal da emissora pela Sky. Talvez só eu tenha notado, pois além do desfile do grupo de acesso, a CNT não tinha mais nada. Durante quase todo o dia, a emissora vendia o espaço para igrejas e empresas de tele-vendas. Entre uma coisa e outra, havia umas novelas mexicanas. Não as da Televisa, novelas mexicanas de verdade, com personagens de nome duplo, penteados armados à laquê e abundante maquiagem.
               Agora a CNT foi comprada por Waldemiro Santiago, proprietário da Igreja Mundial. Ou seja, já não se verá mais carnaval na emissora. De jeito nenhum. A destruição da nossa cultura popular, principalmente no que tange à herança africana, é prioridade para as seitas evangélicas.
               Em matéria recentemente publicada no Globo, falava-se das baianas das escolas de samba. Essas senhoras que sempre foram a própria alma de suas comunidades e de suas agremiações, estão sendo cooptadas pelas seitas e, aconselhadas pelos pastores, estão abandonando o samba e o desfile das escolas. O problema é mais grave, como acentua a matéria do jornal carioca, nas pequenas escolas. Algumas até já perderam pontos por não contar com o número mínimo de componentes na ala das baianas, estabelecido no regulamento do desfile.
                Nesta época do ano, quando o país canta e samba, recrudescem os ataques à nossa cultura, aos nossos valores, por parte dos pastores, bispos de araque e missionários das seitas evangélicas. Essa gente ruim da cabeça se une aos doentes do pé para, num misto de fanatismo e racismo, execrarem as manifestações de alegria do nosso povo. Como o perfil dos fanáticos vem mudando, já não se fala apenas do pecado e das chamas do inferno que estão aguardando os foliões. Não. Com o auxílio luxuoso dos chatos de galocha e caracúlicos profissionais, apela-se para a falácia da alienação do povo provocada pela alegria momesca. O fanatismo quer ser ciência social.





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