sexta-feira, 31 de maio de 2013

Isso aqui é Galo


               
                Outro dia, Juca Kfoury disse que havia acontecido em determinada partida, “aquelas coisas do futebol”. Eu sempre pensei que em todos os jogos de futebol aconteciam aquelas coisas do futebol. É por isso que eu assisto os jogos de futebol: para ver aquelas coisas do futebol. Vai ver que estou enganado e o que acontece nos jogos que assisto são outras coisas e não aquelas do futebol.
                 Pois bem, ontem eu vi as tais coisas do futebol.
                 O Galo, depois do empate heróico em gramados Aztecas, vinha decidir sua passagem às semifinais da Libertadores, no Independência. Tudo estava de acordo com o figurino: estádio cheio, a torcida enlouquecida e a gente precisando só de um empate de 0 X 0 ou 1 x 1 ou uma vitória simples. Mas foi o Tijuana que saiu na frente com um golaço de Riascos pegando de prima um cruzamento da direita. O empate veio ainda no primeiro tempo e durante toda a segunda etapa o Atlético controlou a situação. Um susto aqui, outro ali.
                O tempo regulamentar já se esgotava quando Ronaldinho deu uma arrancada espetacular pelo meio e passou para Luan que penetrava pela direita. O herói no jogo do México chutou cruzado e o goleiro do Tijuana praticou a defesa. Menos de um minuto havia passado, e num chutão os mexicanos puseram a bola na intermediária do Galo. Rever não achou o balão de cabeça e Leonardo Silva no afã de rechaçar a bola pela linha de fundo, cometeu pênalti no atacante do Tijuana. Isso foi aos 46 minutos do jogo que iria até os 49.
                 Bola na marca da cal, a torcida do Galo era um desespero só, um desencanto só. Só nos restava Víctor. 
                Quando Riascos correu para a bola, milhões de corações, numa sístole coletiva e unânime, ameaçavam não voltar a bater. O atacante, o melhor e mais habilidoso atacante do time mexicano fez o simples; chutou no meio do gol contando que Víctor, como qualquer goleiro num final de jogo, fosse escolher um canto e se jogar. E foi o que aconteceu. Só que... só que Vítor jogou para o ar sua perna esquerda na direção da bola, que as mãos não mais alcançariam, e fez a defesa. Classificação garantida com sustos e muitas lágrimas nas arquibancadas do Independência.
                Jogo inesquecível.


quarta-feira, 29 de maio de 2013

Reler, rever


                Nelson Rodrigues dizia que se deve ler pouco e reler muito. Nunca consegui seguir o mandamento do mestre. Sou fominha com essa estória de livros. Não que seja um novidadeiro, não busco os últimos lançamentos nem nada disso. E nem preciso. Há tanta coisa importante que já foi escrita anos, décadas, séculos atrás que fica difícil querer somente o que se produz nos dias de hoje.
                Mas agora, depois de meses lendo “A carne”, de Júlio Ribeiro, me deu vontade de reler e reencontrar alguma emoção de outro tempo.
                Acontece que “A carne” é das piores coisas que já foram publicadas no nosso idioma. E olha que o livro foi motivo de polêmica em seu tempo. Acho que os contemporâneos do autor ficaram aturdidos com a temática, ousada para a época, e não viram que o livro estava abaixo da crítica. Destinado à poeira e às traças. 
                Tardei meses para terminar sua leitura, pois ler mais de uma página por dia de semelhante obra (no sentido mais recôndito do termo) me foi impossível. Também não pude abandonar o maldito livro. Sou ruim de abandonos. De livros e de mulheres. Além do mais, a cada página lida do romance, ficava a curiosidade por saber até onde poderia chegar o pedantismo, a sensaboria, a falta de talento literário de um membro da Academia Brasileira de Letras. E não foi em vão a pertinácia. No fim da insulsa narrativa, o autor, sem nenhum acanhamento, se coloca como personagem. Não um personagem com falas e pensamentos, senão como personagem citado pela protagonista. Elogiosamente citado.
                Depois de tamanha prova de persistência, fui buscar refúgio e descanso em terreno conhecido. Fui ao Eça. Estou relendo O primo Basílio. Não pela estória de Luisa, Jorge e Basílio, mas pelo Conselheiro Acácio.
                Eça de Queirós nos deu no século 19 um personagem que continua atualíssimo. Basta abrir algum sítio informativo na internet ou as redes sociais e lá estão seus seguidores, seus discípulos. Nas TVs e nas tribunas do Congresso também abundam Acácios.
                Poucos livros eu reli, mas filmes eu pude rever alguns. Chaplin, Felini, todo o neo-realismo italiano, Macunaíma, que a cada vez que revejo mais graça encontro, Perdidos na noite, que já assisti mais de 20 vezes, Casablanca e alguns outros.

                Mas houve filmes de que gostei e ao revê-los fiquei pensando se na época que os assisti por primeira vez ou eu era bobo ou andava bebendo muito. “O último tango em Paris” é um desses. Holywood quando tenta fazer filme cabeça dá naquilo. Entre os nacionais, Jabor nos brindou com “Eu te amo”, um dos filmes mais chatos da história do cinema nacional. Além de não contar com Wilson Grey no elenco, garantia da brasilidade da produção, o filme tenta ser um “Último tango” de periferia. O engraçado é que quando o assisti no Cine Imperator do Méier, eu achei o máximo. Culpa, creio, do fim traumático de uma paixão. O amor tem dessas coisas.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

A praça


                As cidades pequenas, além de sua proverbial pasmaceira, nos mostra um microcosmo do país. Assim é onde vivo, em Garopaba, nesse lindo litoral catarinense.
                A política local é um espelho do que se vê na política nacional.  Caciques proprietários de partidos se revezam no poder, pouco fazem pelo povo e muito para os seus. O eleitorado, exaltado em época de pleito, faz grande alarde na defesa de partidos cujas diferenças nem de lupa se consegue distinguir.
                Fazem-se obras de fachada, de utilidade duvidosa, e aqui e ali alguma coisa prática. Para quem está com o poder, tudo são flores e entre os que não mamam,  tudo se desacredita. Tal qual acontece em todo o país. A mesma sociedade conservadora, pequeno- burguesa e metida a cagar regras através das redes sociais. Tal qual.
                Temos aqui uma linda pracinha no centro velho da cidade. De frente para o mar com a antiga igreja ao fundo, é nessa praça que os pescadores ainda amarram nas árvores suas redes para consertá-las. Há um silêncio que o marulhar acentua nas tardes preguiçosas.  
                Desde que aqui cheguei, há vinte anos, a praça já passou por várias obras e modificações. Uma administração anterior trocou as cúpulas das luminárias por umas de plástico que davam uma luz baça e muita vontade de chorar. Agora, depois de muitos milhares de reais, nossa praça está bonita e acolhedora.
                Passei muito tempo sem visitá-la, traumatizado pelas cúpulas de plástico, e voltei lá um dia desses. A praça não é grande, mas sem embargo, conseguiram um cantinho para instalar uns aparelhos de ginástica. Souberam aproveitar bem o espaço exíguo e as instalações não ferem o aspecto de praça de cidade do interior nem atrapalham o caminho.
                Os aparelhos que lá puseram estão como novos, creio que ninguém os usa. E lá estão,  condenados à ferrugem que a maresia apressa. Pois é, alguém teve a brilhante ideia de colocar artefatos de ferro à beira mar.
                E há os bancos de madeira sob belas árvores que não sei o nome, velhas e frondosas, pondo sombras, convidando. No chão de pedras portuguesas brancas e pretas, umas poucas folhas passeiam ao sabor do vento enquanto o gari não aparece. A praça é limpa e tem uma infinidade de lixeiras.
                Nas vezes recentes que visitei a praça pude ficar só ou quase, parece que pouca gente tem gosto de ai estar. Um dia uma menina, uma adolescente, passou uns 45 minutos falando ao celular com uma amiga. Noutro dia uma família de turistas andou de um lado pro outro enquanto o marido desestimulava a mulher de usar os aparelhos de ginástica. Dizia que ela iria se cansar. O sujeito não captou o espírito do exercício físico. No mais, conversas que vêem das casas próximas e algum chato que passa com o som do carro muito alto tocando funk carioca ou sertanejo universitário.
                Mas fica claro que na praça falta algo: os brinquedos para as crianças. Nem um balanço nem um escorregador ou uma gangorra. Nada. Crianças, havia algumas, 4 ou 5 que brincavam de algo que eu não entendi. Na falta de brinquedos adequados para elas, improvisavam algo. Brinquedos lá, só para os adultos.
                Na outra praça, a praça da prefeitura, que é grande e mais central, tem uns brinquedos, poucos, instalados há muitos anos e que estão em estado lastimável. Caindo aos pedaços, remendados. Mas alguém teve a permissão de lá instalar um pula-pula e cobra ingresso para as crianças saltarem na lona suja.  E o pior é que ninguém liga. Nas redes sociais a preocupação dos munícipes é com os cachorros. Querem que seja separada uma parte da praça para que os bichos possam brincar. Querem que seja franqueada a presença de cachorros na praia. Nesse ponto o poder público está acorde com a população, está pouco se lixando para as crianças.


sábado, 25 de maio de 2013

Odiada liberdade


                Talvez não haja nada que o ser humano odeie tanto quanto a liberdade. A liberdade individual, a liberdade do outro, a liberdade coletiva e a própria liberdade. Quase digo que o ser humano odeia principalmente a própria liberdade, mas aí estaria subestimando a capacidade que temos de sermos mesquinhos, vingativos, egoístas.
                Você poderá dizer que as lutas pela liberdade sempre marcaram a história da humanidade. Você tem razão, toda a razão. Mas se houve luta por liberdade é porque essa liberdade havia sido tolhida antes. Por isso tanto se lutou e se luta, por pedacinhos de liberdade. Por que não passa disso: fragmentos pentelhesimais de liberdade.
                Nesse tramo da história que vivemos não é diferente. Veja nosso caso, o caso do Brasil.
                Depois de passarmos mais de 20 anos sob ditadura militar, conquistamos a liberdade. Pelo menos, a liberdade política. E o que fazemos dela? Desbaratamos.
                Para representar a cidadania, são eleitas pessoas que sequer tentam disfarçar seu vezo autoritário. Pessoas que pugnam por um mandato para tolher liberdades. Membros da sociedade civil, no mesmo afã, os apoiam.
                Mesmo aqueles que se julgam defensores das liberdades, apoiam qualquer facínora que lhes prometa mais liberdade em detrimento das de outrem, ainda que essa prometida liberdade nada mais seja que uma liberdade existente apenas na retórica. Afinal os que defendem os inimigos da liberdade, só a querem assim: escrita, letra morta para ser usada em discursos em dia de festa escolar e desde a tribuna dos parlamentos.
                 É de uso comum a citação que diz: minha liberdade termina quando começa a do outro. Nada mais falso, nada mais falacioso. A verdade é que minha liberdade termina quando termina a do outro. Quando qualquer liberdade é ameaçada, a liberdade de todos corre perigo. Não é o que pensa a grande maioria das pessoas que deixam seus comentários nas redes sociais, nas TVs, nos parlamentos.  O que temos assistido nos últimos meses seria inacreditável se não fôssemos testemunhas oculares dos feitos.
                 Desde a tribuna da Câmara, um deputado disse ser inaceitável a decisão do Supremo que obriga os cartórios a transformar as uniões estáveis de pessoas do mesmo sexo em casamento formal. Nem é preciso dizer que o deputado é da bancada evangélica. Para esse deputado e tantos outros, deputados ou não, a liberdade de escolher um parceiro de cama e afeto é algo inaceitável. Mais inaceitável transformar essa escolha em algo público. Para essa gente a liberdade de amar deve ser clandestina, praticada envergonhadamente, às escondidas.
                 Outro deputado viu aprovado na Câmara, o texto base de seu projeto que propõe, entre outras barbaridades, a internação compulsória de qualquer usuário de droga. Nas redes sociais é amplo o apoio ao tal projeto. Parece que quase ninguém suporta a liberdade de uma pessoa escolher que tipo de droga quer meter pra dentro, se as legais ou as ainda ilegais.
                 Mas se tais coisas só acontecessem no Brasil, poderíamos pensar que fosse resquício do arbítrio que imperou por cá durante tantos anos, pois autoritarismo é algo que fica no inconsciente coletivo. Não. Fatos bastante similares ocorrem em outros cantos.
                 Outro dia, na França, um senhor meteu uma bala na própria boca por discordar do casamento igualitário que anda sendo discutido por lá. O suicida, que era historiador, deixou um bilhete para que não restasse dúvida sobre o que o levou ao ato extremo. Para ele, assim como para nosso provinciano deputado, trata-se de coisa inaceitável. As manifestações em repúdio à liberdade de se casar com quem bem se entenda, são multitudinárias em Paris e em outras cidades. Os franceses não querem saber nada de igualdade e muito menos de liberdade.
                  David Cameron enfrenta grandes dificuldades políticas por causa do mesmo tema. Desde que passou a apoiar o casamento gay, o primeiro ministro inglês vem sendo alvo das críticas da ala mais conservadora de seu partido. E seu eleitorado vai migrando para a extrema direita que é mais clara no seu discurso de podar essa e outras liberdades das minorias.
                  Nos EE.UU, país que mais usa a palavra liberdade para justificar tudo, até mesmo o genocídio de outros povos, uma mulher não tem sequer a liberdade de vender seu corpo. Em apenas 3 dos 50 estados americanos, a prostituição é livre.
                  Foi lá também que, na semana passada, foi descoberta a intromissão dos serviços de espionagem nos dados de conversas telefônicas de jornalistas. Não foi arapongagem. O ato de desrespeito à liberdade jornalística foi autorizado pela justiça e em regime de segredo. Para justificar o abuso, que fere a mais óbvia das liberdades, usou-se a desculpa que sempre é avocada para tolher a liberdade naquele país: segurança nacional.
                  Entre os políticos de vários países, nas redes sociais, nas ruas; todos contra a liberdade.



quarta-feira, 22 de maio de 2013

A bolsa e a carteirinha



                Um boato maldoso sobre o bolsa-família levou multidões às agências da Caixa Econômica em todo o Brasil. Pronto, bastou. No dia seguinte, em vez de questionarem a quem interessaria o tal boato, a quem interessaria o caos que se formou nas agências bancárias, quem se beneficia de qualquer descrédito do governo e de seus programas sociais, os inteligentes do facebook começaram a postar charges e montagens fotográficas que criticavam o programa de renda mínima.
                Numa dessas charges, há uma porta com um cartaz que diz: Bolsa-família. Noutra porta o cartaz anuncia empregos. Há uma grande aglomeração diante da primeira porta enquanto na segunda não há ninguém. Na fotomontagem, sob a imagem de uma rua deserta, diz-se que aquilo seria uma manifestação contra a corrupção e sob a foto de uma rua tomada pela multidão, a legenda diz: Corrida pelo bônus do bolsa-família.
                Uma amiga, que conheci militante de esquerda no começo dos anos 80, aderiu à postagem maldosa e reacionária e a compartilhou no facebook. Outra amiga, esta jovem e que conheço apenas da rede social, também postou uma das tiras que tentam ser críticas e cômicas, mas que não passam de esperneio conservador.
                Costumo respeitar a opinião de todo mundo, mas vou abrir uma exceção. E por um motivo muito simples: falta às minhas amigas um mínimo de coerência. De uma com o passado, da outra com o presente. Por que digo isso? Pelo simples fato de não ter lido nenhum comentário de nenhuma das duas sobre outros benefícios concedidos pelo governo.
                Há poucos dias o Congresso votou pela regulamentação da meia-entrada para estudantes nos espetáculos públicos.  Ainda que pelas novas normas a regalia tenha sido mais democratizada, continua sendo uma regalia. Não há nenhum critério sócio-econômico para a cessão da carteirinha que dá direito ao pagamento de preço reduzido aos estudantes. Qualquer estudante poderá requisitá-la junto à UNE. Não importa se o estudante passa férias na Europa e possui carro importado para atropelar ciclistas. Ele terá direito à carteirinha. E isso é escandaloso.
                Todos sabem que os preços das entradas para teatros, shows, cinemas e campos de futebol são majorados por causa da meia-entrada. O produtor de espetáculos tendo de ceder a regalia aos estudantes, cobra a mais daqueles que não estão enquadrados entre os beneficiários do programa, para poder viabilizar seus lucros. Essa majoração atinge diretamente àqueles que sendo pobres e não estudantes nem jovens ficam alijados dos espetáculos pelos altos preços cobrados. Por que não há reclamações contra isso? 
                Ora, a resposta é óbvia. Uma vez que beneficia a classe média e os mais aquinhoados, está tudo certo. Errado, para a classe média mesquinha e burra, é beneficiar exclusivamente os pobres, como é o caso do bolsa-família. Para esta classe que destila preconceito pelas redes sociais, nada pode ser mais odioso do que um benefício ou regalia que não a contemple. 

O contador de sonhos



                Nem sempre somos pegos de surpresa. Quando o vemos se aproximar, ele traz nos olhos um quê de misterioso, de místico, aquele olhar de quem volta da consulta à cartomante ou ao pai de santo. Reconhecemos aquela mirada. E não dá outra: ele vai nos contar um sonho que teve. Ele é o contador de sonhos.
                Ora, todos sonhamos e sabemos de que matéria são feitos os sonhos. O que nos conta o contador de sonhos, não é sonho, é mistificação. Ele deveria guardar tais narrativas para quem vive de interpretar a mentira alheia: os psicanalistas. Mas não. Ele nos quer como confidente do que acabou de inventar.
                Nossos sonhos são povoados de tantas incongruências, contradições, fantasmagorias, que é impossível, na maioria das vezes, narrá-los para alguém. Os sonhos do contador de sonho não. Os dele têm enredo, personagens, ambiências. Enquanto o escutamos, dominando o tédio e fingindo atenção, temos sempre a impressão de estarmos assistindo a um filme ruim de Hollywood.
                Sabemos que esses sonhos são mentirinhas do contador de sonhos. O que ele quer é contar coisas de si, de sua intimidade. Dar sua versão mística, transcendental, da vida.
                Nos sonhos do contador de sonhos é comum a presença da mãe morta vestida de branco indicando um caminho. (O vestuário não podia ser outro e segue o padrão hollywoodiano). Não é raro que por lá também passeie algum animal com conotações místicas, espirituais. Uma criança, loura, é claro, também faz suas aparições nesses sonhos narrados.
                O contador de sonhos, assim como todo mentiroso, nos toma por tolos e quer nos fazer crer que os desvãos dos seus mais profundos infernos estão povoados de querubins. Daí as imagens idílicas que nos pinta enquanto narra o que pretende que aceitemos como um sonho sonhado.
                Esquece-se, esse aporrinhador profissional, que o subconsciente não é lugar para pieguices, sentimentalismos, burlas. Aquilo lá é o abismo, é o deserto. Morada escura que compartimos com súcubos.

terça-feira, 21 de maio de 2013

O choro de Suplicy



                Foi na semana passada. Amargava uma insônia e corria os canais da TV para encontrar algo que me fizesse dormir. Busco daqui, busco dali e nada. Pensei num último recurso: a TV Senado, a reapresentação da sessão plenária.
                A sorte poderia me trazer um discurso do Suplicy. A esperança não era infundada. Suplicy é um senador assíduo no plenário e sempre se inscreve para falar. Como sonífero natural, não há nada melhor. Um único discurso de Suplicy equivale a 2 baldes de maracujina.
                Ademais, o Senador paulista gosta de ler cartas desde a tribuna. Não são cartas dirigidas a ele. São essas manifestações públicas as quais qualquer um poderia ter acesso, se lhe interessasse, sem a mediação do nobre Senador. Mas Suplicy as lê desde a tribuna do Senado. As lê e rompe em copioso choro.
                E não é um chororô qualquer. Não. Quando chora, Suplicy não economiza. Não só o rosto fica banhado em lágrimas, mas também a gravata, os papéis, o lenço, o microfone. Suplicy funga, gagueja, a voz o abandona, volta entrecortada e vai do barítono mais profundo ao falsete. Suplicy gasta todos os RR, todos os eeennndo do sotaque paulistano para externar seu pesar, sua emoção.
                Você, minha amiga, que é sensível e se apieda dos sensíveis, dirá que Suplicy é um emotivo profissional. Pode ser, pode ser, mas constrange. Assistir tamanho berreiro vindo de um pai da Pátria, constrange.
                Imagino que após a leitura das missivas, Suplicy seja encaminhado ao serviço médico do Senado para reidratação e dose reforçada de algum tarja preta poderoso.
                Mas naquela noite insone, o bravo Senador não discursava. Somente alguns dias depois, ele leu a carta de Angelina Jolie. Pois é, Suplicy leu a carta de Angelina Jolie que saíra publicada em todos os jornais do mundo.

segunda-feira, 20 de maio de 2013

Um homem



                    Um homem magro
                    Sua sombra estreita
                    Olhar movente que sempre espreita

                    Olhar movente, palavra pura
                    Gritava mudo na rua escura

                    Um homem longo
                    Cabelo e gesto
                    Mantém-se puro, altivo e lesto

                    Mantém-se puro, pois ainda chora
                    Quando está só como agora

                    Um homem moço
                    De modo plácido
                    Mas na boca fel, no peito ácido

                    Mas na boca fel, há raiva e vômito
                    Neste ser inteiro, todavia indômito

                    Um homem quieto
                    Que bebe calado
                    No entanto louco se embriagado

                    No entanto louco, inconveniente
                    Sabe-se espinho e não mente

                    Um homem que tem
                    Uns poucos amigos
                    Que dele contam casos antigos

                    Que dele contam poucas proezas
                    De sua vida vazia de belezas.




sexta-feira, 17 de maio de 2013

É minha opinião



                As modas no linguajar sempre existiram. Elas vêem e vão. Na década de 90 o “a nível de” fazia sucesso. Depois veio o “com certeza”, que junto com o “no sentido de” ainda se cultiva. No facebook o primeiro vira “concereteza”e faz parzinho romântico com o “nada haver”. Bem, mas isso é apenas analfabetismo amenizado.
                Hoje, o que domina vários discursos é o “onde”. Pode-se fazer lindas frases com o advérbio. Um dos campeões do “ondeísmo” é o ex-jogador e comentarista esportivo, Neto. Dele já ouvimos maravilhas como: “um time onde a zaga...”, “um dia onde a temperatura...” e até “ um jogador onde...”. O “onde”, para piorar, pode ser substituído pelo “aonde” nessas construções.
                Como disse, esses modismos são passageiros e quase nunca provocam danos insanáveis ao idioma.
                Ao contrário das outras modas, os cultivadores das modas lingüísticas não são os mais jovens. É entre os adultos, chegando até a meia idade, que as palavrotas usadas para preencher discurso vazio, fazem mais sucesso.
                Mas há uma outra moda, que além de lingüística é também comportamental. Refiro-me a essa tendência de concluir-se uma argumentação com a frase “é a minha opinião”. Nas redes sociais seu uso se difunde como vírus e serve principalmente para os evangélicos fecharem algum discurso preconceituoso e arcaico. O que essa gente chama de opinião eu designo com outro nome, que não menciono para não ferir sua sensibilidade com escatologias.
                Essa simples frase, que tenta ancorar-se no direito de livre expressão do pensamento, tem servido para destilar toda espécie de raciocínios tortos. Pensam, os cultivadores da frasezinha, que ao pronunciá-la eximem-se de toda responsabilidade para com os preceitos legais escritos e as normas tácitas do convívio e do respeito.
                No momento, o alvo preferencial das “opiniões” dos filósofos contemporâneos do facebook são os homossexuais, mas sobra pra todo mundo: ateus, fumantes, comunistas, hedonistas, onanistas, enfim, qualquer um cujo comportamento, pensamento, aparência, cor da pele ou hábitos, não se enquadre na cartilha do carola opinativo.
                E não adianta protestar contra as ofensas e preconceitos, pois logo seguirá a frase mágica:_É minha opinião. Ademais nesses dias estranhos que vivemos, há outro item na cartilha que deve ser seguido: devemos ser tolerantes. Devemos respeitar as opiniões mais ridículas, os raciocínios mais esdrúxulos e, principalmente as citações bíblicas mais ilógicas e imorais.
                Nesses dias absurdos que vivemos, devemos tolerar a intolerância.

Marina bota tudo a perder



                Agora foi a vez de Marina Silva sair em defesa de Marco Feliciano. Marina disse que Feliciano é criticado por ser evangélico. Caberia perguntar à ex-senadora se ela ou Benedita da Silva ou Marcelo Crivela, ou Garotinho, já foram criticados por serem evangélicos assumidos. A resposta é, desenganadoramente, não.
                Claro que Marina Silva não responderia com um simples não se lhe fosse dirigida a pergunta. Seu linguajar sibilino a impediria. Marina assimilou, com gosto, o discurso típico dos políticos, e o executa com maestria. A entrevista que concedeu após a cerimônia de lançamento de seu partido, foi uma aula de murismo no melhor estilo tucano-kassabista.
                Mas agora, resolveu assumir uma posição clara e o resultado é o que assistimos: uma defesa desprovida de argumentos de uma das figuras mais grotescas da política nacional.
                Marina conquistou mais de 20 milhões de votos no último pleito para a presidência. Creio que poucos desses votos vieram do meio evangélico. Quem nela votou, o fez por sua identificação com a questão ambiental. Ninguém, nem seus adversários, questionaram sua condição religiosa.
                O que fez com que grande parte da sociedade rejeitasse a indicação de Feliciano para presidir a Comissão de Direitos Humanos e Minorias foram suas declarações homofóbicas e racistas. Depois delas, veio a lume uma enxurrada de vídeos postados pelo próprio Feliciano e os de sua igreja, no youtube. Neles, Feliciano diz ver a mão de Deus no assassinato de John Lennon e no acidente que matou os rapazes dos Mamonas Assassinas. Também “profetiza” o fim das religiões de matriz africana, que os fundamentalistas cristãos vêem como manifestações demoníacas. Não satisfeito, Feliciano mentiu com relação à Caetano Veloso e à própria mãe. Ambos, Caetano e a mãe de Feliciano, vieram a público desmenti-lo.
                Ao contrário de Marina, que faz da questão verde uma plataforma política e com ela tenta angariar votos junto a variados setores da população afeitos a esse tema, Feliciano busca o apoio popular exclusivamente entre os crentes. Daí seu discurso retrógrado e obscurantista.
                Feliciano é apenas um tosco, um grosseiro oportunista. Não tem o discurso sinuoso de Marina, nem a vaselina de Crivela. No entanto, ele verbaliza, sem pejo, o pensamento dos seguidores das seitas pentecostais e com isso vem ganhando terreno junto a um eleitorado de cabresto, fiel e dado ao messianismo. Seu nome tornou-se nacionalmente conhecido e é admirado pelos evangélicos mais preconceituosos e obtusos.
                Tomando a defesa de Feliciano, Marina bota a perder sua inserção em setores da sociedade que são quase inexpugnáveis para um fundamentalista cristão e que, sem embargo, nunca haviam levado em conta sua religião. 

quinta-feira, 16 de maio de 2013

Falta vergonha



                No Governo Fernando Henrique Cardoso, criou-se um programa de subsídio do gás de cozinha muito interessante. As famílias que consumiam pouca energia elétrica levavam suas contas pagas até o correio e lá recebiam um vale para trocar por botijões de gás. Além de prover os mais pobres com esse produto de primeira necessidade, o programa ajudava a economizar energia elétrica.
                Num dia daqueles tempos, eu fui  aos correios postar uma carta. Havia fila. Enquanto esperava, escutava as conversas das pessoas e assuntava. 
               Um senhor que estava na minha frente tinha em mãos uma grande quantidade de contas de luz para serem trocadas por vales de gás. Julguei tratar-se de um desses bons samaritanos que estaria prestando um serviço aos vizinhos de algum bairro distante do centro da cidade, evitando assim que gastassem o dinheiro da passagem de ônibus. Não era.
               O senhor, que reconheci depois de alguns minutos, era um sujeito que possuía muitas casas de veraneio próximas à praia. Como as casas não eram alugadas fora da temporada turística, seu consumo de energia era baixo e seu proprietário tinha então o “direito” de receber os vales para trocar pelo gás de cozinha.
                Estava claro que o tal programa não estava dirigido àquele tipo de público e sim às famílias que consumiam pouca energia elétrica por viverem em casas pequenas e não possuírem muitos eletrodomésticos. Um quarto e sala com 4 lâmpadas, geladeira, chuveiro elétrico, TV e liquidificador. O programa se propunha a ajudar gente pobre.
                Fiquei imaginando o que faria aquele cara-de-pau com tantos botijões de gás. Na certa teria de  revendê-los, pois em dois meses os botijões de gás que ele obtinha com as trocas, supriria sua necessidade pessoal e das casas de aluguel para o veraneio. Sobrariam 7 meses de acumulo de botijões. Tenho certeza que ele não só se julgava em pleno direito de receber o subsídio na forma de vales-gás como também se sentia um benfeitor da humanidade por revender os botijões de gás por uns centavos mais barato, àqueles que, por ultrapassarem o teto de consumo por uns centavos, não tinham direito ao beneficio.
                Nada impedia que ele agisse daquela maneira. O programa falhara em não antepor cláusulas que barrassem esse tipo de comportamento. O que sobrava àquele senhor em casas e botijões faltava-lhe em dignidade.
                Hoje, em minha cidade, a prefeitura tem um programa de distribuição de cestas básicas às famílias carentes. Um dos postos de distribuição fica perto de minha casa e, vez por outra, vejo as pessoas indo buscar os produtos básicos de consumo. Só não posso afirmar que sejam carentes, pois é comum ver carros que devem valer 12, 15, 20 mil reais com a mala aberta para levar os gêneros que deveriam suprir as necessidades dos que nada têm.
               O programa do subsídio do gás acabou faz tempo, talvez devido aos desvios de finalidade.  Quanto às cestas básicas, continuarão sendo distribuídas sem nenhum critério sócio-econômico, afinal quem as recebe quer que o programa continue e vota em quem os favorece. E os votos são todos iguais. Tanto faz os dos carentes quanto os da classe média sem vergonha na cara.


terça-feira, 14 de maio de 2013

O chapéu de John Wayne



                Já dizia o Chacrinha que na televisão nada se cria, tudo se copia. O fenômeno é antigo como a própria maquininha de fazer doido. Já no tempo do Velho Guerreiro, o hábito de copiar a ideia alheia era comum, usual, mas ainda estávamos longe de ver a desfaçatez dos dias de hoje.
                As fórmulas de sucesso são copiadas até a exaustão nos canais das TVs, pagas e abertas. Muitas vezes vemos 3 ou 4 programas absolutamente iguais sendo exibidos no mesmo horário em canais distintos.
                Os campeões das cópias são os "realities shows". Destes há para tudo: cabeleireiros, cozinheiros, encantadores de cachorros, vendedores de quinquilharias, caminhoneiros, cabeleireiros de cachorro, casamenteiros, aventureiros solitários e em duplas, conselheiros de moda, recuperação de viciados. De cada um dos tipos pelo menos 2 programas. E, de alguns, suas respectivas cópias nacionais.
                O engraçado é que de “reality” eles não têm nada, é tudo forjado como aquelas lutas de mascarados que já fizeram sucesso no Brasil nos anos 60 e que continuam tendo grande audiência entre americanos e mexicanos.
                 Além dos "realities shows", essa praga que assola a humanidade, outro tipo de programa que vem ganhando espaço nas TVs por assinatura é o "Stand Up Show". No canal 85 da SKY há uma série deles e, claro, uma cópia brasileira da fórmula americana.
                Os americanos têm suas idiossincrasias, suas bossas, seu jeito de ver a vida e o mundo, e isso se reflete na sua criatividade e senso de humor. O problema é quando tentamos imitá-los.  É como Chitãozinho e Chororó com aqueles imensos chapéus texanos fazendo sombra para suas diminutas figuras. Chapéu de John Wayne não orna em cabeça de caboclo.
                No caso dos “Stand Up Shows” acontece o mesmo. Não é nosso tipo de graça. Não nos sai bem. Mas os programadores do canal 85 acham que sim e não só promovem os tristes espetáculos, como usam nas chamadas dos tais programas, um trecho da apresentação de Danilo Gentili.
                Ora, todos sabemos que Gentili é mais sem graça que namoro de crente, mas eu pensava que ele ficava nisso, na falta total de jeito para o negócio de humor. Não. O sujeito, durante os poucos segundos que dura a chamada, nos brinda com o que há de mais grotesco, mais chulo, mais boçal de tudo que já foi mostrado na TV brasileira.
                Mas, verdade seja dita, quem alçou a grosseria de Gentili e afins, ao patamar de comedia, foi a distinta audiência. No afã de copiar o modo de vida americano, seus valores, trejeitos e até mesmo seu humor, nossa classe média usa , sem o menor senso de ridículo, o chapelão do cowboy.



domingo, 12 de maio de 2013

Brás Cubas e as alianças espúrias



                Não me lembro se no livro, mas no filme Brás Cubas, o personagem defunto, vivido por Luiz Fernando Guimarães, diz uma frase, uma dessas citações vazias que os falsos inteligentes da nossa burguesia gostam de perpetrar:_O Brasil é de espantar, e de espantar-se. Uma típica frase que não diz nada e apenas serve de adorno para a conversação frívola dos salões senhoriais.
                Mas na semana que passou, a frase começou a fazer sentido. Podemos, sem dúvida, dizer, parafraseando o Brás Cubas do filme, que a política brasileira é de espantar e de espantar-se.
                Nossa Presidenta criou mais um ministério. Isso, em si, não é novidade. Já são tantos os ministérios, que nem nos lembramos mais de seus nomes, finalidades e, muito menos, seus titulares. Há ministérios para tudo e que não fazem nada. Ou melhor, acomodam nulidades e seus parentes em nome das alianças, da governabilidade.
                Qualquer desses ministérios de ficção gasta fortunas. Os homi estão acostumados com o bem bom e não ficam despachando seus interesses escusos em qualquer salinha. Não. Há de tudo nas estruturas ministeriais: carros oficiais, muitos; assessores, muitos: secretárias gostosas, várias e toda a serventia posta à disposição dos senhores ministros. Para servir água mineral importada das geleiras escandinavas e cafezinhos, há na esplanada dos ministérios, prestando seus inestimáveis serviços, gente suficiente para encher o Maracanã.
                Tudo isso já sabemos e pagamos. O que espanta é o nome do novo titular da flamante Secretaria da Micro e Pequena Empresa: Afif Domingos. O novo Ministro vai acumular a titularidade da pasta com seu cargo de vice-governador de São Paulo. Ou seja, como Ministro ele será oposição ao governo do qual é vice-governador e como tal, será oposição ao governo do qual é Ministro. É ou não é para espantar-se?
                Afif disse que caso tenha de substituir o Governador Alkimim no comando do Governo paulista, se licenciará do Ministério. Simples assim. Deveríamos imaginar que a agenda do Governador de São Paulo está totalmente sincronizada com o cronograma do Ministério recém inventado. Deveríamos, mas nem precisamos. Sabemos que o novo Ministério não é para ser levado a sério. Dentro das costuras políticas, é um alinhavo, um chuleado, se tanto. Pouco ou nada produzirá em benefício do micro empresário além de algumas medidas burocráticas concebidas nos gabinetes dos assessores do afanado Ministro.
                Em comentário publicado há poucas semanas, uma colunista de política alertava para uma estapafúrdia aliança do PT com os tucanos paulistas. Tal conluio teria como finalidade aplainar o caminho da reeleição de Dilma. Para tanto, o PT abriria mão de candidatura própria ou escolheria nome com poucas chances de vitória para a disputa pelo Palácio dos Bandeirantes. Por sua vez o PSDB faria com Aécio o que fez com a candidatura de Serra à presidência, apenas fingiria apoio.    
                Quando li o artigo, pensei ser mais um samba da colunista doida, afinal o sonho dos petistas paulistas é desempoleirar os tucanos do governo do mais rico estado da união. No caso dos tucanos faria mais sentido, boicote e fogo amigo são especialidades dos emplumados. Com a criação do Ministério e a escolha de seu titular, começo a pensar que tinha razão a articulista em seu arrazoado. 
                Ainda não ouvimos o que pensa de tudo isso Fernando Henrique Cardoso. Quando o oráculo de Higienópolis se pronunciar sobre o tema, aí sim, poderemos dizer como o Brás Cubas do filme:_ O Brasil é de espantar e de espantar-se.

sábado, 11 de maio de 2013

O homem na lua e a cobra falante



                Em meados dos anos 80 eu conheci um sujeito que por nada desse mundo acreditava que o homem tivesse pisado na lua.
                Nessa época eu era ingênuo o suficiente para pensar que através da argumentação lógica alguém pudesse ser demovido de suas crenças, pelo menos, as que não fossem as mais profundas. Mas o homem se mostrava irredutível, e quase me chamando de idiota, contra-argumentava que era impossível que eu não visse que o que foi mostrado na televisão em julho de 69, havia sido feito em Hollywood. Uma produção cinematográfica, nada mais, dizia, e ele me olhava com ar indulgente, como que se apiedando de mim.
                Na verdade, ele não se apiedava de nada. Estava, isso sim, muito satisfeito com sua superioridade intelectual, com sua argúcia. Nem é preciso dizer que eu também acreditava na piedade humana. Acabei deixando pra lá, não voltei ao assunto e ficamos apenas no bom dia e boa tarde quando nos encontrávamos.
                Mas sabe o que aprendi com as conversas que tive com aquele incrédulo do pouso na lua? Nada. Pois é, não aprendi nada. Continuo tentando demover pessoas de suas crenças absurdas. Perco tempo precioso debatendo com gente que acredita em arca de Noé, homem feito de barro e cobra falante. Não tomo jeito.
                Como alguém pode pensar que vá influenciar uma pessoa que freqüenta a Igreja Cuspe de Cristo ou a Igreja Bola de Neve ou a Igreja Assembléia de Deus Botas de Fogo Ardentes e Chamuscantes? Quem entra num templo de uma dessas seitas de nomes tão ridículos (e os há às centenas) já está predisposto a aceitar qualquer coisa. Se não vê por sua conta que até no nome existe uma fraude, um escárnio, não sou eu quem vai provar isso. Não poderia. A capacidade dessa gente em acreditar nas mais bizarras afirmações vindas de pastores, bispos de araque e afins, é de assombrar. É o que vemos agora no caso do pastor Marcos Pereira da Silva.
                Acusado de estupro, assassinato, tráfico de drogas, pedofilia, lavagem de dinheiro e associação para o crime, o homem de Deus vem recebendo irrestrito apoio, não só de Marco Feliciano, o homem dos direitos humanos, como também de fiéis. Uma mulher, que se diz pastora, postou na internet uma comovente carta na qual diz que por um instante, só por um instante, chegou a duvidar da inocência do pastor, mas orou e Deus lhe disse que era tudo mentira. Segundo ela o Todo Poderoso citou a bíblia para asseverar que tudo é obra de Satanás, que nesses últimos dias fará levantar falsos testemunhos contra o povo de Deus. (Imagino que Ele tenha dito “meu povo”.)
                As vítimas do pastor que o acusam, estariam possuídas pelo Imundo, fazendo o serviço do Diabo. As investigações de mais de um ano feitas pela polícia, também coisa do Canhoto. A imprensa que divulga o fato, instrumento do Inimigo.
                Deve ser nessa hora que o velho Belzebu se olha no espelho turvo do inferno e diz:_Eu sou foda.



quinta-feira, 9 de maio de 2013

Uma sociedade que se esborracha



                Quando eu nasci, a televisão brasileira tinha 7 anos de existência. E eu já ia pelos meus 7 quando meu pai comprou nosso aparelho. Antes, víamos a novidade na casa de minha avó Benita. “O direito de nascer”, eu assisti aí. Mas um dia veio a TV para nossa casa.
                A programação começava pelas 3 ou 4 horas da tarde e ia até meia noite. Lembro-me bem de interromper as brincadeiras no quintal para ver o Super Homem e o National Kid, o Ivanhoé e o Jim das Selvas. A telinha era fascinante.
                Na época se discutia os malefícios da nova tecnologia que dia a dia entrava nos lares da classe média baixa. As mães reclamavam do tempo perdido pelos filhos que ficavam hipnotizados em frente ao aparelho. E um dia o pior aconteceu: um menino amarrou uma toalha no pescoço e tentou voar como o Super Homem. Lançou-se do telhado da casa e esborrachou-se. O caso, eu não sei se é verídico ou apenas lenda urbana, mas nós, meninos, ríamos muito da ingenuidade, tanto do moleque quanto de nossas mães que temiam que fôssemos capazes de cometer o mesmo tipo de tolice.  
                Não foi essa notícia (ou boato) que me influenciou, mas devo confessar que apesar de gostar do Super Homem eu preferia mesmo era o National Kid. Estou convicto que se não fosse por ele os Incas Venusianos já teriam dominado a terra.
                Entre o advento da televisão e a internet, mais de 40 anos passaram. Hoje, são os computadores que fazem algumas mães renegarem da tecnologia. E não sem razão. O que mais preocupa, além do fato de mais de 80% dos acessos à grande rede serem para jogos, é a questão da interatividade, pasto para predadores sexuais e toda sorte de crimes contra os pequenos.
                Assim como a televisão, a internet tem seu lado negativo, mas não se pode negar, nem num caso nem no outro, a maravilha da comunicação. Pode-se dizer que o Brasil se conheceu através da televisão e hoje, a internet está permitindo que conheçamos o brasileiro. E pasmamos.
                Lembro do ingênuo menino dos anos 60 que queria alçar voo e esborrachou-se. Vem-me logo a pergunta:_Está o ser humano, o brasileiro, preparado para essa nova tecnologia? A resposta, como diria o Ministro Marco Aurélio, é desanganadoramente, não.
                No facebook, o ser humano (e o brasileiro é dos que mais acessa essa rede social) se desnuda, se confessa. Nunca antes se viu tamanho despudor em mostrar, em exibir, a alma, o coração e as vísceras. E o que vemos? Uma sociedade brutalizada. E nessa hora da madrugada a vontade é de escrever, imbecilizada.
                Tal qual o menino voador que não sabia distinguir a realidade do que era mostrado numa tela de televisão, os aficionados das redes sociais não sabem reconhecer um factóide, não conseguem perceber a mais óbvia manipulação dos fatos. Nos últimos dias, isso se fez mais patente.
                Nossas autoridades da segurança pública andam fazendo uma operação de “limpeza” nas grandes cidades visando deixá-las seguras e arrumadinhas para os gringos que nos visitarão nos grandes eventos marcados para este e os próximos anos. No Rio, pessoas estão sendo mortas a luz do dia, diante das câmaras de televisão. Em Cuiabá, moradores de rua são chacinados. Quaisquer manifestações de repúdio a esses fatos estão sendo reprimidas com a truculência habitual da polícia. E o que vemos nas redes sociais? Nossos amigos e seus amigos apoiando as ações ilegais. Dizendo que a Globo, por ter criticado as ações policiais no Fantástico do último domingo, está defendendo bandidos. O termo direitos humanos é usado por esses justiceiros do nada, com escárnio. Vira motivo de chacota. Em caixa alta, louva-se a política de extermínio. E tudo isso entre a foto de um cachorrinho e uma citação de Buda.
                Não tenho dúvida, nossa sociedade vai esborrachar-se.




terça-feira, 7 de maio de 2013

A escritora



                Você sabe, eu tenho cá meus problemas com o vernáculo. Não pense que meus erros são fruto de incúria ou desleixo. Não, eu tento caprichar. Principalmente quando penso que você, minha amiga, pode estar lendo meus escritos, não posso menos que tentar caprichar. 
                Mas não é o que faz todo mundo que bota seus pensamentos em letra de imprensa. Existe hoje quase que um desprezo pelas regras mais primárias do idioma. E aqui não me refiro só aos comentaristas do facebook e dos sítios informativos. Falo de gente que vive do ofício de pôr tintas no papel. O fato é que nunca na história desse país se escreveu tão mal. E fala-se pior ainda.
                O Brasil bem que mereceu um Prêmio Nobel de Literatura com Guimarães Rosa, Drummond ou João Cabral. Hoje eu não sei se temos literatos nesse mesmo patamar. É bem verdade que não leio os últimos lançamentos, os novos escritores não me são familiares, mas intuo que a coisa anda mal nas letras brasileiras.
                Um dos motivos de minha desconfiança com relação a nossa produção literária atual são os textos que escritores mandam para jornais, revistas e sítios informativos da internet. Veja se não é o caso.
                A escritora Márcia Denser já escreveu uma porrada de livros e quando digo uma porrada, é uma porrada mesmo. Um de seus romances, A ponte das estrelas, virou best seller e outro teve adaptação para o cinema. Confesso que nunca os li. Nem esses nem nenhum outro da autora. Conheci Márcia Denser através do sítio Congresso em foco, no qual ela assina uma coluna semanal.
                Márcia Denser coleciona prêmios literários e contos seus fazem parte de antologias importantes. Já foi traduzida em oito idiomas. É Mestre em comunicação e semiótica pela PUC-SP e foi curadora de literatura da Biblioteca Sérgio Milliet em São Paulo
                 Como cronista, ela não faz meu tipo. Seu tom, geralmente agressivo, não me agrada. Lendo-a tenho sempre a impressão de estar diante de algum relatório escrito por um burocrata bêbado. Bêbado e desiludido.
                Esta semana, em sua coluna no Congresso em foco, Márcia Denser assina um texto cujo título “É a imprensa, estúpido”, diz muito de sua forma de se comunicar com seus leitores. A escritora deve pensar que somos uns masoquistas patológicos e nos ofende desde o título, pois lendo o artigo, sabemos que o estúpido a quem ela se refere somos nós mesmos.
                Mas isto seria apenas uma questão de forma, de estilo. O que vem já no segundo parágrafo do artigo citado é o que quero comentar. Lá, Márcia Denser nos manda a seguinte letra: “Na melhor das hipóteses, pode-se dizer que houveram períodos...” Pois é, houveram. Escritora, jornalista mestre em comunicação e semiótica, curadora de literatura e manda um “houveram”.
                Dona Telma, lá nos anos 70, me ensinou que o verbo haver significando existir, vai sempre no singular. Dona Telma não era escritora. Era uma professora de português numa escola da periferia onde estudavam filhos de operários, mas fora aluna de Magda Soares. Amava as letras e, penso, seus alunos. Chegava de longe no seu fusquinha para nos deixar menos toscos.  
                Mas voltando à profissional das letras e seu texto.
                Alguns parágrafos adiante Márcia Denser nos brinda com mais essa: “a direita e os conservadores passaram a fazer o que bem entendesse...” E aí, me peguei pensando: _Cadê a concordância, estúpida? Apenas não o disse porque sou metido a educadinho.

Doença ou adversário?



                Acontece. O sujeito anda por aí muito fagueiro e num exame qualquer lhe diagnosticam um câncer. Dependendo do tipo de câncer, da precocidade do diagnóstico e da situação econômica do cidadão, ele tem boas chances de cura. Foi o que aconteceu com a Presidenta Dilma e com o ex-presidente Lula, já o Comandante Chaves não teve a mesma sorte.
                Câncer não escolhe idade, classe social, etnia nem credo. Sua capacidade democrática de matar é o que o torna temível e terrível.
                Sem embargo, há entre os afetados pela doença um grupo especial: são os famosos.
                A cura de um cidadão comum pode ser atribuída à sua fé, ao milagre do santo, às preces da família. Pouco ou nada se fala da medicina, das pesquisas dos cientistas ou da perícia do médico. Mas o paciente será, assim como quem o tratou, ignorado. O sucesso do tratamento será atribuído ao divino, ao sobrenatural.
                Quando de famosos se trata, é diferente. Um famoso não se cura, ele vence o câncer. Se for um atleta, a “batalha travada” ganha tons épicos na voz dos narradores esportivos. O cara já não é um paciente, é um herói. Foi ele que venceu a doença jogando na casa do adversário, com torcida contra e na altitude. Médicos, drogas, tratamentos de ponta? Que nada, foi ele quem venceu o câncer a custa de muito treinamento e esforço pessoal. Assim foi com o Lance Armstrong.
                O ciclista teve um câncer nos testículos, se curou, ou melhor, derrotou o câncer com vários quilômetros de vantagem. Criou aquela pulseirinha para arrecadar verbas não sei pra quê, e ele, que já era herói, entrou para o rol dos semideuses. 
                Pouco tempo depois soube-se que Armstrong pedalava dopado. Foi punido, esperneou, voltou atrás e reconheceu o doping tentando diminuir a punição e poder voltar ao esporte. Os adoradores de ídolos ficaram com cara de tacho. Os narradores esportivos pararam de falar em superação, exemplo de vida e outras bobagens de ocasião quando se referiam ao atleta. Já era tarde para reconhecer que Armstrong era apenas um cara que teve câncer e se curou. Um cara que milita num esporte no qual os casos de doping são freqüentes.
                Mas rei morto, rei posto. Há que se criar um novo herói para ser exemplo para os pacientes anônimos do SUS do Meier e ensinar-lhes a vencer o câncer.
                Semana passada eu assistia a luta entre Floyd Maywheather e Robert Guerreiro. Antes da peleja, muito se falou da vida privada dos pugilistas. De Maywheather dizia-se que estivera em cana por dois meses por ter batido na mulher e de Guerreiro, que se afastara dos ringues por longo tempo para cuidar de sua mulher que estava com câncer.
                Atrás de espessa camada de reboco, cílios postiços e plumas de pavão, estava a Senhora Guerreiro que, sempre que era mostrada na tela, arrancava do narrador da luta frases como:_ Ela também é uma guerreira!
                Ao final do combate, vencido por grande margem de pontos por Mayweather, a TV já não mostrava mais a “guerreira”. É que para virar heroína e exemplo de vida na TV, não basta derrotar o câncer por knockout, o marido tem de vencer a luta. Aí sim é happy end.

segunda-feira, 6 de maio de 2013

A estupidez ao alcance de todos



                Às vezes eu não sei se é má fé ou burrice pura e simples. Como não gosto de pôr em dúvida a honra de ninguém, acabo por pensar que é a estupidez humana a causa de tantas declarações e argumentações que tenho escutado ultimamente. Veja o caso do Lobão.
                Em entrevista recente, o cantor (?) falou as maiores aberrações. Defendeu o golpe de 64 e deu uma versão dos fatos ocorridos àquela época que nem o próprio Bolsonaro seria capaz de dar. Lobão que já havia, em outra ocasião, minimizado a tortura dos presos políticos da ditadura, apenas manteve uma galopante coerência com o pensamento (?) de sua classe social.
                O problema é que os jornalistas, principalmente os da área de cultura, crêem que se o sujeito é famoso ele pode ser questionado sobre qualquer assunto. As opiniões de Caetano Veloso sobre política estão sempre sendo pedidas. Até o marido da Sandy, aquele da família Lima, eu já vi sendo entrevistado sobre a proibição de armas de fogo no Brasil. O que se pode esperar?
                Mas o buraco é mais embaixo quando os ”doutores” são chamados a opinar sobre os problemas da sociedade. É o que tem acontecido nesses tempos datênicos quando se discute a redução da maioridade penal. Não passa um dia sem que haja nos noticiários alguém dando sua douta opinião sobre o tema.
                Num recente debate na Globo News, um desses luminares defendia a tese da chibata e do pelourinho para os jovens infratores. Dizia o convidado de Mônica Valdvogel que adolescentes praticam crimes porque têm a certeza da impunidade. Enquanto ele falava, aparecia no pé da tela a relação de seus títulos e pergaminhos.
                Eu costumo respeitar todas as opiniões, mas nesse caso vou abrir uma exceção. O argumento me parece tão pueril que dá vergonha rebatê-lo. Se fosse como pensa esse senhor que nos brindou com seu arrazoado troncho, os presídios estariam vazios, pois os adultos sabem que podem ser punidos se forem apanhados cometendo delitos. Como sabemos, não é o caso.
                Outro argumento usado por aqueles que querem inaugurar novos campos de concentração, é que o jovem de hoje tem mais acesso à informação. E citam a internet, a TV a cabo, o cinema 3D, a fibra ótica, o escambau.
                Ora, até mesmo a mais crassa burrice tem seus limites. Não é possível que alguém pense que os jovens vão à internet para consultar a Enciclopédia Britânica ou o Anuário da Academia Brasileira de letras. E, ademais, quem tem acesso às novas tecnologias, à informação, à educação?  
                Sabe-se que mais de 90% dos menores infratores internados, sequer concluíram o ensino primário e que provêem das classes mais baixas. Menores infratores das classes abastadas, quando atropelam pessoas no ponto de ônibus ou nas praias com seus Jet Skis, não são candidatos às novas vagas que querem abrir nos presídios. A classe média não vê os seus filhotes que trazem exctasy da Europa como bandidos e sim como alguém com problemas, uma vítima da família desfeita ou do consumismo. E, claro, tem as más companhias.
                Muitos daqueles que até pouco tempo se posicionavam contra a redução da maioridade penal, hoje se mostram arrefecidos de ânimo. Diante dos coices de Datena, Magno Malta e outros da mesma espécie, se acanham, e já sentem pejo de defender a prevenção, a inclusão social e a educação como instrumentos de combate a violência juvenil. Aos poucos vão cedendo ao que a imprensa de direita chama de clamor da sociedade.

sexta-feira, 3 de maio de 2013

Leis contra a democracia



                Entre todas as instituições brasileiras, a mais desacreditada é, sem dúvida, o Congresso Nacional. Um grande número de parlamentares responde processos na justiça pelos mais variados crimes. Isso sem contar os privilégios de que desfrutam. O epíteto de ladrão lhes é dirigido, sem o menor reparo, por quase todos que acompanham a política no Brasil.
                Vez por outra nossos legisladores tentam apaziguar os críticos cortando partes irrisórias desses privilégios. Foi o que se passou há pouco tempo com o 14º e o 15° salários que recebiam em total afronta aos cidadãos. Ainda assim ficaram com 2 dos 8 salários extras que sacavam durante os 4 anos de mandato.
Ademais, há o baixo clero composto por despreparados, ineptos, evangélicos e oportunistas em geral, que nada produzem. Mal comparecem ao plenário.
                Mas, cá entre nós, como tudo isso é histórico, já nos acostumamos. Nos damos por satisfeitos quando Suas Excelências não atrapalham. Mas isso é raro. Afinal antes de que seja paga a devida propina e que se dê altos cargos comissionados aos seus filhos, sobrinhos e genros, nada acontece. Obras param, programas modernizadores emperram.
                Outro fator que distingue nossa classe política em geral e especialmente os ocupantes do Congresso, é sua total inapetência para o trabalho legislativo. Muitos culpam as medidas provisórias enviadas pelo Executivo. Estas medidas estariam sempre trancando a pauta e impedindo o labor das casas legislativas. Mas é só mais uma desculpinha safada, mais uma mentirinha dos senhores parlamentares. Há mais de 2.000 dessas medidas provisórias esperando a apreciação do parlamento, muitas há mais de 10 anos.
                Mas esse ano eles resolveram trabalhar, resolveram fazer leis. E com que nos brindam nossos representantes em matéria legal? Com um festival de propostas absurdas, estúpidas e na contramão da história.
                Uma dessas proposições avoca para o Legislativo, tirando do Executivo, o poder de demarcar terras indígenas. Claro, o projeto de lei tem o carimbo do latifúndio e o aval da bancada evangélica.
                Também vem dessa bancada um projeto de lei que dá direito a qualquer igreja, de interpor Ação Direta de Inconstitucionalidade junto ao Supremo. Ou seja, qualquer diploma legal vindo do legislativo municipal, estadual ou mesmo do Congresso Nacional poderia ser questionado por Malafaias, Valdomiros e afins. Com um simples pedido de liminar, uma seita, que tenha representação nacional, poderia paralisar uma administração.
                De tão bizarra, a proposta tenderia a dormir nas gavetas do Congresso, mas não. A estupidez cavalgou rápido pelas comissões da Câmara e está pronta para ser votada em plenário.
                Outro absurdo que pretende virar lei, também provém de gente ligada às seitas religiosas. Refiro-me ao projeto do Deputado Osmar Terra que cria a internação compulsória de viciados em drogas. De olho nas polpudas verbas que sairão dos cofres públicos para as instituições que tratam dependentes químicos, pastores e bispos de araque já estão esfregando as mãozinhas. As seitas são donas de inumeráveis campos de concentração “terapêuticos”.
                Mas o que mais escandaliza é PEC 37. Esta emenda à constituição quer tirar do Ministério Público seu poder de investigar deixando para nossos valorosos e honestos policiais o monopólio da investigação criminal. Claro, o Ministério Público incomoda. Vem dessa instituição grande número de denúncias contra os senhores políticos e suas gangues. É retaliação pura e simples.
                 Se você acha pouco, há outra proposta de lei que trás o vezo da retaliação, dessa vez contra o Supremo. É a PEC 33 de autoria do obscuro Deputado Nazareno Fonteles do PT do Piauí.
                Aprovada na CCJ, com amplo apoio da bancada evangélica, este arremedo de emenda quer que decisões do STF passem pelo crivo dos congressistas. Muitas das sumidades que integram nosso legislativo mal escrevem o nome, mas poderiam opinar sobre os doutos votos dos Ministros da mais alta Corte do país.