Algum tempo atrás, num programa esportivo, os caras, pela
total falta de assunto, começaram a falar dos jornalistas que atendiam por
nomes femininos e citaram o Maria (Antônio Maria Filho) e o Helena (Alberto
Helena Júnior). Alberto Helena estava presente e contou da origem de seu
sobrenome italiano e, falando no idioma de seus antepassados, disse que os
Helena eram uma família piu potente em determinada região da Itália. Cléber
Machado, que comandava o programa, não se conteve e perguntou o mesmo que me
ocorre perguntar a todo filhote de gringo que arrota as grandezas do passado
familiar. “E o que vocês vieram fazer aqui?”
Se é que a história só se repete como farsa, há também as
farsas que se repetem como tal. Assim foi o processo de colonização européia no
Brasil. Após a libertação dos escravos o país “constatou” que não tinha mão de
obra e escancarou as portas para a imigração dos despossuídos do velho
continente.
Muitos dos novos colonos receberam terras e financiamentos,
outros foram para as fazendas de café para viverem em condições precárias, instalados nas antigas senzalas, ou quase isso, mas com a substancial diferença
de receberem salários. Para os escravos recém libertos nunca houve uma política
compensatória, nenhum plano de assentamento, nenhuma indenização. O resultado
dessa política de imigração é o que vemos: descendentes de imigrantes ricos e
negros pobres por todo o país.
Passadas algumas gerações, os filhos e netos daqueles
famélicos imigrantes começaram a criar a lenda dos “piu potentes” e de
perseguições políticas das quais seus antepassados fugiram. Se fôssemos
acreditar nessas estórias, pensaríamos que qualquer camponês italiano ou alemão
do século 19 era um carbonário, um anarquista.
Agora dá-se algo parecido. Toda semana tem alguém dizendo
nos jornais e TVs que o Brasil carece de mão de obra especializada e que a
solução seria importá-la enquanto não se melhora a educação no país.
Não tenho a menor ideia se isso é verdade ou não. O que sei
é que a economia brasileira está entre as maiores do mundo e que a educação
aqui é uma vergonha. Mas pelo jeito nossa mão de obra tem dado conta do recado,
caso contrário seria impossível atingir os números de crescimento que
atingimos. Ou será que todos os técnicos que ajudam a produzir nossas riquezas
vieram da Europa?
Nos programas de TV, nos quais a direita tem assento
garantido e voz assegurada, números sobre a insuficiência de mão de obra
qualificada são citados e eu não posso nem vou contestá-los. Prefiro falar
sobre algo que conheço de perto.
Sou um desses 6 milhões de babacas que arrumaram uma diabetes.
Na minha cidade, linda cidade à beira mar e no sul maravilha, não há um só
médico endocrinologista. Nenhum. Pedi no posto de saúde (na minha cidade não
tem hospital) uma consulta com um desses especialistas em Floripa. Isso foi em
setembro e ainda não me chamaram para agendar a tal consulta. Claro que não
fiquei esperando, senão já teria morrido. Busquei um especialista particular.
Na minha cidade também não há. Um médico endocrinologista, que é de outra
cidade, vem aqui aos sábados e atende pela manhã. Só sábado, só de manhã.
Sabe o que eu queria? Um cubaninho. É. Um endocrinologista
cubano que ficasse por aqui para eu me consultar de vez em quando. Podia ser de
Havana, de Santiago ou até mesmo de Guantánamo, pois os endocrinologistas de
São Paulo, do Rio e do Mato Grosso não se interessam em fixar residência na
minha linda cidade à beira mar.
O Governo Federal ameaçou atender minha demanda por um
cubaninho endocrinologista, mas todos os médicos brasileiros, que não se
interessam em vir me atender, fizeram protestos e uma gritaria dos diabos. A
direita, que não pode ouvir falar em Cuba sem ter um chilique, também protestou
e acho que não virá o endocrinologista guantanamero cuidar de meu pâncreas
falido e do meu índice glicêmico.
Mas, alvíssaras, o Ministro da Saúde agora diz que virão
médicos portugueses e espanhóis desempregados pela crise européia. Não sei o porquê da mudança de nacionalidade dos médicos que virão suprir a
falta de profissionais brasileiros pouco dispostos a sair dos grandes centros.
O que sei é que os médicos que se mostraram tão indignados com a vinda de seus
colegas cubanos, chamando-os de curandeiros no ato público em repúdio à sua
contratação pelo governo brasileiro, saudarão a chegada dos médicos europeus.
Afinal essa nova leva de imigrantes vem do nunca demais incensado, primeiro
mundo.
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