terça-feira, 22 de outubro de 2013

Tozim


Dizem que os amigos não os fazemos, os reconhecemos. Acho que foi isso que se deu quando conheci o Tozim.
Eu freqüentava uma turma no Alto Barroca, um típico bairro da classe média belorizontina. Não fazia muito tempo que eu por lá andava, um ano, pouco mais. Tinha ido parar naquelas ruas levado pelo Eduardo e ao fim de alguns meses, fiquei mais íntimo dos caras que ele. Principalmente do Careca, do Ronim, do Cássio e do Mazim.
Com essa turma bebi, fumei muita maconha e comi cogumelo pela primeira vez.  Também com eles  acampei várias vezes na Serra do Cipó. Foi o fim do meu ciclo nas Alterosas e foi em ótima companhia.
Um dia, fui praqueles cantos procurar conversas. As ruas estavam vazias na tarde quase azul. Não achei ninguém até vir o Tozim.
Eu o conhecera há poucos dias. Ele havia se mudado pra lá vindo do norte de Minas e talvez por ser da mesma região de meus antepassados, eu logo simpatizei com ele, com seus olhos apertados, os lábios finos que soltavam rápidas palavras meio de canto com  sotaque já puxando pro abaianado. Gostei de seu sorriso sincero de camarada.
Nesse dia que narro, falamos de cachaça. Ele era de Januária, creio, e o assunto veio  naturalmente. Resolvemos beber, para conhecer, aquela cachaça São Francisco que tinha sido recém-lançada com propaganda na TV e tudo mais. O mote publicitário da birita dizia: “Rico também bebe cachaça”.
Não que fôssemos metidos a besta ou algo assim. Os dizeres da propaganda para nós era apenas uma referência de qualidade. E era disso que falávamos: da qualidade da cachaça de Januária, tida como a melhor do Brasil. Aos 18, 19 anos já nos achávamos expertos  ou, pelo menos, queríamos parecer para o outro. Vaidade viril de moços.
Resolvemos pela prova da São Francisco, mas quando escarafunchamos nossos bolsos, não saíram mais que umas moedas. Acho que cada um esperava que o outro estivesse mais fornido. Lembro que fizemos umas diligências para conseguir uma intera, mas não deu. As ruas estavam avaras de outros vagabundos e até as casas dos amigos pareciam desertas.
Enquanto batíamos perna ladeira abaixo, ladeira acima, fomos entabulando nossa conversa. Eu nunca pequei por calado e Tozim também gostava de charla.
Por fim desistimos de conseguir dinheiro emprestado e acabamos mesmo numa vagabundíssima cachaça de armazém. Bebíamos enquanto íamos daqui pra lá pelas ruas tão iguais, tão burguesamente iguais. Passando a garrafa naquele ritual de querer bem.
Não me lembro das outras vezes que me encontrei com ele. De certo houve outras vezes, mas a lembrança só quis guardar aquela tarde.

Meses depois fui para o Rio e nunca mais voltei a morar em Belo Horizonte. Isso foi em 76. Nunca mais vi Tozim.

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