domingo, 18 de janeiro de 2015

Vândalos incendiários



Foi na primeira manifestação do ano contra o abusivo aumento das passagens de ônibus. A Globonews transmitia ao vivo e enquanto seus jornalistas falavam em vândalos e baderneiros, uma imagem era mostrada. Parecia que estava sendo colhida do alto de um edifício. Via-se que na interseção de duas vias ardia uma fogueirinha.
Desatento aos clichês da narração me lembrei da versão de Gil para o clássico de Bob Marley “No woman no cry” quando o baiano fala “ observando estrelas junto à fogueirinha de papel”. Era isso que se via: uma fogueirinha de papel no meio da rua. Mas em volta da minúscula fogueira juntou gente, ou melhor, juntaram-se fotógrafos e cinegrafistas. Um deles ajoelhava-se para melhor filmar a fogueira, outros davam voltas em torno do minguado foguinho como se buscassem o melhor perfil. Era o making off da farsa que os farsantes mostravam despercebidamente. A fogueirinha devia estar se achando; mais fotografada que rainha de bateria.
 O engraçado é que a imagem dos cinegrafistas e fotógrafos rodeando a fogueirinha como se estivessem diante da erupção do Vesúvio combinava com a narrativa dos jornalistas que tratavam aqueles meninos mascarados com mochilas estudantis às costas, como terroristas, inimigos da sociedade ordeira e do povo trabalhador.
Ao se dar conta da fogueirinha, que era apenas um ponto luminoso na tela, o jornalista baixo clero que estava no estúdio da TV dos Marinho sem saber mais o que dizer, recebeu um encosto que só costuma baixar no Jabor e começou a falar no estratagema das fogueiras que eram ateadas para chamar a atenção da polícia, enquanto os baderneiros se reagrupavam para mais uma investida contra o patrimônio e o direito de ir e vir do cidadão de bem.

O advento da fogueirinha ardilosa e astuta e sua descoberta jornalística pode ter sido um marco nas coberturas de manifestações no Brasil. De agora em diante, pode ter certeza, os meninos mascarados serão chamados de vândalos incendiários e baderneiros pirômanos. 

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