sábado, 31 de outubro de 2015

Quem protege os meninos?





          Estamos nos animalizando. Não me refiro aos pronunciamentos de Magno Malta nem às leis propostas por Eduardo Cunho e seus acólitos da bancada evangélica. Refiro-me ao homem comum. Quase ia dizendo que trato do homem das ruas, mas não é isso. O homem comum de hoje não é o homem das ruas, é o homem do teclado, das redes sociais, do palpite infeliz, dos comentários apressados sobre manchetes mal feitas. O homem que não é capaz de discernir, de desmascarar uma demagogia mesmo que ela seja esfregada nas suas fuças.
          O mui vivo Papa Francisco se deu conta do mundo em que vive e tem explorado ao máximo essa capacidade do homem moderno de engolir tudo in natura. Daí a doação de guarda-chuvas para os sem teto de Roma e os passeios turísticos para mendigos.
          Acabo de ler que em Curitiba o prefeito Gustavo Fruet proibiu a circulação de veículos de tração animal na cidade. Pronto, isso bastou para que o prefeito fosse elogiadíssimo pelos defensores dos animais e comentadores em geral. "Curitiba dá, mais uma vez,uma demonstração de inovação e sustentabilidade", disse o prefeito.
           A lei, originária do poder executivo, proíbe inclusive que se leve fardos no lombo de animais esteja o condutor montado ou não.
           Na matéria que li na página da prefeitura fala-se que um grupo de trabalho foi criado para cuidar da situação das pessoas afetadas pela proibição. Ora, é sabido que quando alguém quer fazer alguma coisa vai e faz e quando não quer fazer nada cria um grupo de trabalho ou uma comissão. Se, pelo menos, o tal grupo de trabalho tivesse sido criado antes da aprovação da lei poderia-se pensar que havia alguma preocupação com as famílias que sobrevivem dos pequenos fretes e da coleta de material reciclável utilizando-se do trabalho animal. Mas não, Colocou-se a carroça na frente dos bois. Os animais adiante das pessoas.
            Você poder objetar que tudo que emana dos políticos tem o dom de iludir, que eles são pós graduados nessa arte e o povo apenas vai atrás. Isso é verdade, mas há também o que sai desse homem moderno das redes sociais que não depende da interferência dos políticos para atingir o mesmo grau de demagogia e estupidez. No facebook circulou uma foto de um burro puxando uma carroça carregada de material para reciclagem. O estado do animal era deplorável e isso acarretou os mais iracundos comentários dos palpiteiros profissionais. Nada mais justo, você dirá. Acontece que a carroça era conduzida por dois meninos. Um deles não passaria dos 8 ou 9 anos. Vi várias vezes essa postagem e li dezenas de comentários referentes a ela. Em nenhum desses comentários, nenhum mesmo, se falava dos meninos, do trabalho infantil, da insalubridade daquela tarefa de vasculhar entre dejetos, dos perigos a que estavam sujeitos. Falava-se exclusivamente do pobre animal. Quando um desses meninos for varado por uma bala da polícia em uma de suas incursões em favelas e periferias, serão esses mesmos piedosos palpiteiros que lhe vão imputar crimes que nunca cometeu e dizer que bandido bom é bandido morto.
              Quanto à lei protetora de Curitiba é bom que se diga que ela tem exceções. Os haras, as hípicas, o turfe, as cavalgadas e os lugares onde se pratica a equoterapia não estão sujeitos aos seus rigores. Podemos dormir em paz.

         

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